Conjunto de medidas de incentivo a experiências em sistemas agroflorestais (SAFs) vai enfatizar produção e recuperação de áreas degradadas. Volume investido será de R$ 90 milhões em dez anosEstá praticamente pronto para ser lançado o Plano Nacional de Silvicultura com Espécies Nativas e Sistemas Agroflorestais (Pensaf). O texto, conseqüência de uma demanda antiga da sociedade, sinaliza que o governo finalmente vai dedicar a atenção devida a uma das principais alternativas para encontrar a sustentabilidade no campo: os sistemas agroflorestais (SAFs).
Elaborado por uma equipe interministerial composta pelas pastas de Meio Ambiente (MMA), Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), Desenvolvimento Agrário (MDA) e Ciência e Tecnologia (MCT), o plano deve ser publicado em novembro. Seu lançamento inaugurará a primeira política pública concebida para estimular experiências de pequeno e médio porte em SAFs, especialmente com ênfase em espécies nativas. Está previsto investimento de R$ 90 milhões em crédito, disponibilização de insumos, assistência técnica, capacitação e pesquisa ao longo dos dez anos de vigência do Pensaf.
De acordo com Bernardo Machado Pires, da gerência de reflorestamento e recuperação de áreas degradadas, vinculada à diretoria do Programa Nacional de Florestas do MMA, o Pensaf procura atuar sobre duas vertentes principais: incentivo à produção e à recomposição de áreas degradadas.
Do ponto de vista econômico, a idéia é aumentar a geração de renda a partir de florestas, dentro da lei, naturalmente. Hoje, esse enorme potencial é subestimado: apenas 5,5% das matas brasileiras têm funções produtivas. E mesmo assim 4,5% do Produto Interno Bruto (PIB) advêm do setor florestal.
O alvo maior dessa estratégia são os produtores familiares e os extrativistas. "É comum ver grandes e médios empreendimentos madeireiros. Queremos que os pequenos passem a explorar essa fonte", afirma Bernardo. Segundo ele, que foi um dos representantes do MMA na equipe que elaborou o Pensaf, esses agricultores têm por característica uma relação mais sustentável com a terra e a floresta e poderiam reduzir a exploração predatória de larga escala.
O outro eixo de atuação do Pensaf será a recuperação de áreas degradadas. Dentro dessa perspectiva, os maiores esforços serão direcionados à recomposição das chamadas matas ciliares, que margeiam rios e riachos. O maior obstáculo à revitalização desses ambientes é a ausência de mudas nativas. "Não se pode recuperar plantando eucaliptos", explica Bernardo.
O Pensaf enfatiza a necessidade de espécies nativas nos empreendimentos por ele beneficiados. Para isso, pontos de coleta de sementes nativas serão criados.
O que são SAFs?Em poucas palavras, SAFs podem ser conceituados como "formas de uso múltiplo da terra com a presença de espécies arbóreas e agrícolas, com ou sem a criação de animais". A definição é do professor Ivan Crespo, da Universidade Federal do Paraná. "A virtude desses sistemas é que eles atendem bem a critérios produtivos, ambientais e sociais", explica ele.
Segundo Ivan, que é também presidente da Sociedade Brasileira de Sistemas Agroflorestais (SBSAF), isso permite que eles tenham as mais diversas aplicações. Além das duas principais, reforçadas pelo Pensaf - aumento da produção florestal sustentável e recuperação de áreas degradadas -, eles oferecem maior proteção física ao solo, reduzindo o risco de transformações bruscas e podem servir para atrair animais, aumentando a biodiversidade local. "Além disso, podem produzir madeira, culturas anuais tradicionais, espécies medicinais, fibras e óleos", enumera.
Essa variedade de itens que podem ser trabalhados nos SAFs faz com que, quando comparados com as monoculturas, eles apresentem um potencial econômico infinitamente maior. Outra vantagem é que, por representarem sistemas praticamente fechados, em que a floresta retro-alimenta os gêneros agrícolas e vice-versa, a necessidade de insumos é muito menor do que nas lavouras convencionais.
Isso explica o aumento significativo que as experiências em SAFs sofreram nos últimos anos. O incremento é evidenciado pelo próprio Congresso Brasileiro de Sistemas Agroflorestais, organizado pela SBSAF. Segundo Ivan, em 1989, quando foi realizada a primeira edição, foram apresentados por volta de 20 trabalhos. Em 2006, ano do último congresso, o número saltou para 700, com pesquisas de todo o país, da América do Sul e diversos outros países.
De acordo com Ivan, milhares de empreendimentos baseados em SAFs estão sendo conduzidos no país. A maior concentração deles está na região Norte. "Isso se explica pelo fato de que lá está a floresta modelo para os SAFs, que nada mais são do que uma maneira de imitar a mata e sua biodiversidade", justifica.
Ivan avalia o Pensaf como uma grande conquista, que se iniciou em alguns estados pioneiros, como Pará, Rondônia e Paraná, que já contam com políticas locais de incentivo aos SAFs há alguns anos. Para ele, o processo evoluiu para nível federal quando o governo se sensibilizou para sistemas de produção que pudessem atender preceitos ecológicos, o que os SAFs fazem perfeitamente.
"Um ponto importante envolvido no Pensaf é a abertura de crédito para experiências nesses sistemas, o que antes era muito restrito", conta Ivan. Mas ele ainda acredita que falta informação aos bancos, que ainda utilizam o parâmetro da monocultura no momento de conceder financiamentos.
(Repórter Brasil /
Amazonia.org, 06/09/2007)