O tempo seco deixa várias regiões do país em estado crítico. Num período de 24 horas (até 13h desta quinta-feira), os satélites monitorados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) registraram 23.381 focos de incêndio espalhados pelo Brasil. A situação é ruim também em países vizinhos. O Paraguai entrou em estado de emergência, com 1.416 queimadas em curso. Na Bolívia, são 815. Em São Paulo, 144 cidades estão sendo castigadas.
De acordo com o banco de dados do Inpe, apenas em áreas de conservação ambiental os focos de fogo detectados somaram 25.272 de julho até esta quinta-feira, dia 13.
- Temos três condições críticas para propagar o fogo. Temperatura alta, baixa umidade do ar e um longo período sem chuva. Mas não há fogo que comece sozinho. Há sempre um isqueiro ou um fósforo por trás - denuncia Alberto Setzer, pesquisador do Inpe responsável pelo monitoramento das queimadas no país.
A explicação dos meteorologistas para o aumento das queimadas é o fato de que as massas de ar quente e seco estão cada vez mais freqüentes no país.
As regiões brasileiras mais afetadas são o Centro-Oeste e parte da região Norte, mas as queimadas se espalham por todo o país. Durante 12 dias consecutivos, o fogo consumiu cerca de um terço do Parque Nacional da Chapada dos Guimarães, no Mato Grosso, cobrindo Cuiabá de fumaça escura. A estimativa é que 11 mil hectares tenham sido consumidos no incêndio.
Com um ecossistema que inclui de savanas a matas fechadas, o parque abriga sítios arqueológicos e cabeceiras de vários rios das bacias do Alto Paraguai e Amazônica. A força-tarefa de 230 homens criada para combater o incêndio chegou ao local dois dias depois da identificação do primeiro foco. Dois aviões e um helicóptero foram usados. O fogo só foi controlado na última terça.
- Temos ainda vários focos urbanos de queimada e o problema de educação ambiental é sério. O Mato Grosso tem sido o campeão de focos no país e persiste a cultura de colocar fogo em folhas secas. O vento acaba levando faíscas. Cheguei a Cuiabá em 1991 e nunca vi estiagem tão longa e forte - diz o biólogo Marcos Borges Lenza, coordenador do Projeto Quadrante.
Somente nas últimas 24 horas, os satélites do Inpe detectaram 4.688 focos de incêndio no Mato Grosso. De acordo com Lenza, é o maior número dos últimos 10 anos. No Maranhão, são 3.975. O campeão é o Pará, onde o mapa do Inpe mostra uma extensa área ao sul do estado coberta por fumaça. São 5.842 registros de queimadas no estado.
Não chove em Cuiabá desde o início de maio. Os termômetros marcavam 38 graus na manhã desta quinta-feira e a umidade do ar tem ficado inferior a 20%. Nos estados do Sudeste, onde não costumam ser registradas temperaturas tão altas nesta época do ano, apesar da estiagem. Em São Paulo, não chove há 40 dias. De acordo com o Inpe, 438 focos de fogo de diferentes proporções estão em curso. No Rio de Janeiro, são 51.
Setzer afirma que várias cidades, principalmente no centro-oeste, estão sufocadas pela fumaça das queimadas e por trás delas está o uso indiscriminado e descontrolado do fogo no país.
- Existe consenso de que isto está errado, mas os milhares de focos continuam diariamente. É como se a polícia soubesse que todos os ladrões estão roubando e não se fizesse nada - diz o pesquisador, que acompanha on-line o surgimento dos focos.
Setzer afirma que, ao contrário da crença popular, de que o fogo surge sozinho com tempo seco, ou causado por algum vidro ou metal, as queimadas no Brasil têm origem criminosa.
- Quem provoca o fogo são pessoas. Ele não começa sozinho. Não é como chuva ou tsunami, que ocorre espontaneamente. Queimadas naturais só ocorrem com queda de raio. Se não chove em várias regiões há 120 dias, não há como ter incêndio de causa natural - explica.
Setzer afirma que o Brasil é o quinto maior poluidor mundial e cerca de 85% das emissões são provenientes das queimadas. Segundo ele, o problema não é o gás carbônico (CO2), mas a fuligem (material particulado) que atinge a atmosfera e outros tipos de gases emitidos na queima.
Em São Paulo, mais de 140 cidades estão sendo castigadas pelas queimadas. Não chove há pelo menos 40 dias e o tempo seco facilita a propagação do fogo. Desde o dia 1 de agosto, quando começou a estiagem os satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos, registraram 6.637 focos de incêndio no estado.
No Rio, incêndio em parques é vandalismo, diz coronel
Os incêncios que castigam desde a quarta-feira a vegetação nos parques estadual da Pedra Branca e nacional da Tijuca , no Rio de Janeiro, não foram provocados pela estiagem, mas por vandalismo, segundo o coronel do Grupamento Florestal.
A prática de queimada é considerada crime por lei federal, que prevê pena de prisão entre seis meses e quatro anos e multa, que varia dependendo da gravidade do dano e de como foi classificado, se culposo ou doloso (com intenção).
Além de causar danos e desequilíbrio ambiental, as queimadas prejudicam a qualidade do ar. Nas proximidades de cidades, elas agravam a poluição e pioram doenças como asma, rinite e bronquite. Nas estradas, a fumaça pode causar acidentes.
(Por Cleide Carvalho,
O Globo Online, 13/09/2007)