Debatedores ouvidos hoje pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados manifestaram opiniões divergentes sobre o processo de titulação das terras dos quilombolas, normatizado pelo Decreto 4.887/03. O presidente da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), Leôncio de Souza Brito Filho, defendeu a revogação do Decreto 4.887 ou a suspensão de sua aplicação, argumentando que as demarcações de terras estão sendo feitas sem o contraditório. Além disso, acrescentou, existe uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) contra esse decreto, impetrada pelo Democratas. Brito Filho observou que estão sendo reivindicados 25 milhões de hectares para as comunidades quilombolas. "Isso é 34,7% das atuais áreas destinadas para reforma agrária", comparou.
O presidente do Incra, Rolf Hackbart, no entanto, contrariando a afirmação de Brito Filho de que as demarcações estão sendo feitas sem ouvir os agricultores que ocupam as áreas, informou que todos os processos vão ser analisados pelo Judiciário. Hackbart disse ainda que o Incra concedeu até agora apenas 23 títulos definitivos. Existem, segundo ele, 558 processos abertos, mas "faltam recursos para dar celeridade ao processo de emissão de títulos".
A coordenadora da 6ª Câmara da Produradoria Geral da República, Débora Duprat, também afirmou que existe o contraditório na demarcação de terras para as comunidades dos quilombos. De acordo com a procuradora, feitos o laudo e o estudo, as partes podem se manifestar.
Reconhecimento
A Fundação Cultural Palmares é quem reconhece as comunidades quilombolas e depois encaminha o laudo para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a fim de que seja feita a demarcação das terras. Durante a audiência, o presidente da fundação, Zulu Araújo, defendeu o processo de reconhecimento feito pela entidade e disse que não há provas de que a instituição tenha cometido irregularidades no processo de reconhecimento das 1.170 comunidades quilombolas feitos até agora.
Para a representante da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Quilombolas Clédis Rezende de Souza a concessão do título da terra é a segurança de que ela não será grilada. "Estamos lutando pela recuperação de parte das terras que a comunidade perdeu e hoje está confinada em poucos hectares", disse. Para Clédis, "contestar o direito de um povo é um ato de racismo".
Divergências
Um dos autores do requerimento para realização da audiência, o deputado Adão Pretto (PT-RS) defendeu a demarcação das terras, observando tratar-se de uma dívida "vergonhosa" que o Brasil tem com os quilombolas. "Negar esse direito é negar o patriotismo a essas comunidades", afirmou. Já o autor do Projeto de Decreto Legislativo 44/07, que suspende a demarcação das terras, deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), explicou que não é contra a luta dos quilombolas, mas, sim, contra a tentativa de desabrigar produtores rurais. Colatto argumentou que se deve levar em consideração também o direito dos "brancos" que compraram as terras. O deputado Domingos Dutra (PT-MA), que considerou o projeto de Colatto um retrocesso, lembrou que o produtor que tiver terras demarcadas como áreas quilombolas será indenizado.
(Por Oscar Telles, Agência Brasil, 11/09/2007)