A modificação da cobertura vegetal do cerrado, que vem sendo substituída pela agropecuária e por culturas como a de cana-de-açúcar, contribui para o aquecimento global. Mas é possível conciliar desenvolvimento econômico, agricultura e preservação ambiental por meio da regularização ambiental. Esses foram alguns dos assuntos debatidos na audiência pública da Comissão Mista Especial de Mudanças Climáticas do Congresso Nacional, realizada nesta terça-feira (11/09), Dia do Cerrado.
A professora do departamento de Ecologia da Universidade de Brasília, Mercedes Bustamante, explicou que a alteração da cobertura vegetal - para a pecuária, plantio de grãos e de cana-de-açúcar - facilita a liberação do carbono presente no solo e aquece o ar, já que não há o resfriamento do ar quente em trocas com a copa alta das árvores. Apesar de o cerrado ser sumidouro de carbono no período chuvoso, se torna fonte durante a seca, mais ainda com os incêndios. Dessa forma, avaliou a especialista, é preciso controle e monitoramento do desmatamento e das queimadas. A especialista afirmou ainda que a produção da cana também aumenta as emissões de óxido nitroso (N2O), outro gás de efeito estufa, produzido a partir de fertilizantes nitrogenados.
Outro ponto que, para Bustamante merece atenção, é a produção bovina. Os animais liberam em seu processo digestivo o gás metano, e uma partícula de metano é 25 vezes mais potente do que uma molécula de CO2, para causar o efeito estufa.
- O total emitido pelo rebanho bovino em um ano é semelhante ao CO2 produzido por 36 milhões de veículos de passeio no mesmo período - revelou.
Para diminuir esses efeitos, o representante da organização não-governamental The Nature Conservancy (TNC), Carlos Klink, ressaltou que a atividade agrícola precisa ser considerada parte do ecossistema para conciliar o uso da terra, os benefícios econômicos gerados a partir disso com a preservação ambiental.
- É possível conciliar agricultura e conservação com a promoção da regularização ambiental e melhores práticas - defendeu.
Para exemplificar, citou o caso de Lucas do Rio Verde (MT), primeiro município a promover a regularização ambiental ao se adequar ao Código Florestal, com a determinação de reservas legais. A partir do cadastro e diagnóstico das propriedades rurais, é possível adequar as áreas de produção às áreas de preservação permanente (APPs) e reservas indígenas, por exemplo. Com isso, destacou, há redução de custos, cria-se um ambiente de cooperação e se abre à possibilidade de exportação para mercados mais exigentes, como o europeu, que valoriza iniciativas como o selo verde.
- Nosso sonho é inserir milhões de hectares de preservação em terras privadas que continuem produzindo - disse.
Aquecimento
A secretária de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, Maria Cecília Wey de Brito, citou estudo elaborado pelo professor José Antônio Marengo, do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC/Inpe), que destaca a realidade do aumento da temperatura no mundo. No Brasil, ela se elevou 0,7ºC nos últimos 50 anos. Com a continuação do fenômeno, disse, haverá "aridização" do semi-árido e mais secas na região tropical ou amazônica, e o aumento de temperatura até 2100 deve chegar a quase 6ºC na parte mais norte do país. Em todo o Brasil, a média de temperatura deve aumentar em torno de 3º a 4º C.
- Hoje, a média é de vinte e seis graus centígrados - afirmou.
Como conseqüência disso, prevê o estudo, ocorrera expansão da deficiência hídrica no país e aumento das condições precárias para os ecossistemas brasileiros.
Também participaram da audiência o diretor de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Bráulio Ferreira de Souza Dias, e o analista ambiental da Secretaria de Mudanças Climáticas e Qualidade Ambiental do MMA, Adriano Santhiago de Oliveira.
A audiência faz parte das comemorações da Semana do Cerrado, uma iniciativa da comissão e da ONG The Nature Conservancy.
(Por Elina Rodrigues Pozzebom, Agência Senado, 11/09/2007)