Crescimento regional ainda não encontrou o modelo sustentável de que tanto precisaO avanço da fronteira na Amazônia tem sido marcado por degradação dos recursos naturais, violência e por um crescimento econômico rápido, porém não-sustentável na maioria dos municípios da região. De fato, nesse modelo de ocupação, a economia segue o padrão 'boom-colapso'. Ou seja, nos primeiros anos da atividade econômica ocorre um rápido e efêmero crescimento na renda e emprego (boom), seguido muitas vezes de um colapso social,econômico e ambiental. Os conflitos no campo e os assassinatos rurais pela disputa de terra se mantêm elevados e estão espacialmente relacionados ao desmatamento e à abertura da fronteira agropecuária e madeireira.
Por sua vez, o IDH da região (0,705) aumentou nos últimos anos, especialmente pela melhora de indicadores de acesso à educação. Mesmo assim, este índice manteve-se inferior à média brasileira. Os municípios com maior contingente de população imigrante do Sul e Sudeste do Brasil apresentam melhor IDH quando comparados a outros, o que evidencia o processo de importação de IDH.
Embora o PIB tenha crescido acima da média nacional nos últimos anos, ainda representa apenas 8% da economia brasileira. O PIB per capita (US$ 2,32 mil) cresceu apenas 1% ao ano nos últimos anos na Amazônia, mantendo-se 40% inferior à média brasileira. Além disso, apenas 21% da população economicamente ativa tinha um emprego formal em 2004; sendo a maioria no setor público.
A análise da violência e da socioeconomia nas diferentes fronteiras de ocupação e desmatamento da Amazônia (não-florestal, desmatada, sob pressão e florestal) fortalece a tese de que o desenvolvimento econômico segue o padrão boom-colapso como proposto por Schneider etal. (2000). Ou seja, no curto prazo, os indicadores econômicos (PIB e emprego) crescem e o IDH é favorecido pela geração de renda e atração de imigrantes. Mas os custos são altos: violência,degradação das florestas e desmatamento.
No longo prazo, as regiões muito desmatadas apresentam redução nas taxas de violência e indicadores socioeconômicos inferiores às regiões onde o desmatamento está acontecendo.
VoracidadeO avanço da fronteira na Amazônia é um processo dinâmico, voraz e heterogêneo. Esse processo é relativamente recente e foi impulsionado nas décadas de 1960 e 1970 pelo governo por meio de incentivos para a ocupação e integração da Amazônia ao mercado doméstico. Nas décadas de 1980 e 1990 houve redução dos investimentos públicos em infra-estrutura e em outros projetos na região. Porém, a ocupação da fronteira se intensificou com o boom da atividade madeireira associado ao crescimento da pecuária, do agronegócio e da especulação de terras públicas.
No início do século XXI, as forças que atuam na Amazônia são mais complexas e incluem, por um lado, os investimentos com potencial de ampliar o desmatamento, tais como os gastos públicos (principalmente infra-estrutura e crédito), a expansão de assentamentos de reforma agrária e o aporte de capital privado para atender o mercado global nas áreas de mineração, agropecuária e exploração madeireira. Por outro lado, há iniciativas de conservação e uso sustentável dos recursos naturais, tais como a criação de unidades de conservação, o combate à grilagem de terras públicas e o aprimoramento do sistema de licenciamento, monitoramento e fiscalização ambiental.
O avanço da fronteira é marcado pelo desmatamento, pela degradação dos recursos naturais e pela violência rural. Em pouco mais de três décadas, o desmatamento passou de 0,5% do território da floresta original para quase 17%, atingindo cerca de 700 mil quilômetros quadrados em 2006. Pelo menos 14% dessas áreas desmatadas encontram-se degradadas e abandonadas (Arima et al. 2005). Além disso, áreas extensas de florestas sofreram degradação pela atividade madeireira predatória e incêndios florestais.
O modelo de ocupação predominante na região (exploração madeireira predatória e conversão de terras para agropecuária) tende a resultar em uma economia local que segue o padrão 'boom-colapso'.
Ou seja, nos primeiros anos da atividade econômica ocorre um rápido e efêmero crescimento (boom) seguido de um declínio significativo em renda, emprego e arrecadação de tributos (colapso) (Schneider et al. 2000)1. A renda cairia pelo colapso da exploração de madeira e pela conversão econômica da terra para a agropecuária, atividade que não mantém a mesma geração de renda e empregos. A baixa rentabilidade da agropecuária ocorreria principalmente nas regiões com maiores índices de chuvas, onde a baixa vertilidade dos solos e a proliferação de pragas e doenças são mais freqüentes, em especial nas culturas de grãos (Schneider et al. 2000).
Por outro lado, nas áreas relativamente mais secas da Amazônia (em geral, correspondendo aos cerrados), onde a pluviosidade é inferior a 1.800 mm/ano (em torno de 17% do território) e as condições para agricultura são relativamente mais favoráveis, a tese do 'boom-colapso' não se aplica necessariamente (Schneider et al.2000). Por exemplo, a região produtora de grãos no centro-norte do Mato Grosso, situada em área intermediária entre o cerrado e a floresta densa, até agora tem conseguido manter um bom desempenho econômico, mesmo tendo perdido a grande maioria da cobertura florestal.
MineraçãoAlém disso, é provável que os municípios cuja economia está baseada na mineração possam evitar o colapso econômico mesmo após a exaustão dos recursos florestais, pois a renda gerada pela atividade minerária é expressiva e pode potencialmente ser usada para estabelecer uma economia mais diversificada e competitiva.
A tese do 'boom-colapso' em escala regional pode ser testada comparando-se os indicadores econômicos e sociais das zonas da Amazônia que já perderam grande parte de suas florestas com aquelas que ainda são ricas em florestas. Se o 'boom-colapso' está ocorrendo como previsto no modelo de Schneider et al. (2002): as novas fronteiras de ocupação terão melhores indicadores de crescimento econômicos do que as velhas. Para testar essa hipótese, foram comparados onze indicadores relacionados aos temas de violência, economia e IDH entre as diferentes zonas de ocupação da Amazônia. Antes da comparação por zonas, foram analisados a evolução desses indicadores na escala dos estados e municípios.
População cresce e incha as cidades da região
A Amazônia evoluiu de um relativo vazio demográfico em 1960 (apenas 5,4 milhões de habitantes) para 11,2 milhões em 1980 até atingir 22,5 milhões em 2004 (12% da população brasileira). A maioria (73%) dessa população está nas cidades e apenas 27% no campo (Ipea 2006 a 2007). Em 1970, a situação era inversa: 64% da população era rural e apenas 36% era urbana.
O maior crescimento populacional ocorreu entre as décadas de 1970-1980 quando a população cresceu 5,4% ao ano. Esse crescimento foi provocado por políticas públicas que incentivavam a migração por meio de projetos de colonização, incentivos fiscais para a agropecuária, grandes projetos de mineração e de infra-estrutura.
Entre 1991 e 2004, a população da Amazônia aumentou em uma taxa anual (2,8%) superior à brasileira (1,8%). Em 2000, a população amazônica era majoritariamente jovem (69% com 25 anos ou menos) e tinha expectativa de vida (66 anos) inferior à média brasileira (69 anos) daquele ano (Pnud 2003).
A migração exerce forte influência no crescimento demográfico regional. Entre 1991 e 2000, a região recebeu cerca de 700 mil migrantes. Em 2000, 4,3 milhões de habitantes (21%) da população residente na Amazônia eram migrantes. Desse total, cerca de dois terços era originário das outras regiões do País, enquanto um terço veio da própria região (migração intra-regional).
A densidade demográfica na região em 2000 (3,8habitantes/km²) era bastante inferior à média brasileira (20 habitantes/km²). A densidade demográfica dos municípios da Amazônia varia de acordo com sua proximidade aos eixos fluviais e rodoviários. Em 2000, 52% dos municípios da Amazônia tinham densidade demográfica igual ou inferior a 5 habitantes/km².
(
O Liberal, 09/09/2007)