Os 21 países que integram o fórum de Cooperação Econômica Ásia-Pacifico (APEC) são alvo de críticas por terem adotado no sábado um plano para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa que inclui apenas “metas desejáveis”. Grupos ambientalistas disseram que a estratégia é completamente inadequada para proteger o mundo dos efeitos da mudança climática, provocada pela emissão desses gases que aquecem a atmosfera.
O primeiro-ministro da Austrália, John Howard, disse ao fim da cúpula da APEC, em uma declaração que leu diante das câmeras de televisão, que houve acordo quanto à “necessidade de uma meta desejável, de longo prazo, para reduzir as emissões” de gases que causam o efeito estufa. “As metas desejáveis são vagas e não são de cumprimento obrigatório”, afirmou Ian Kiernan, presidente do capitulo australiano da organização Limpara o Mundo, que colabora com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e reúne 35 milhões de voluntários em mais de cem países.
Esses voluntários “estão demonstrando seu compromisso com a redução das emissões de gases que causam o efeito estufa através de atividades em suas comunidades. Os líderes da APEC os decepcionaram completamente”, acrescentou Kiernan. Catherine Fitzpatrick, ativista da organização Greenpeace, disse à imprensa que “a adesão voluntária ao objetivo desejável de reduzir as emissões em 25%, no mínimo, até 2030 significa que tudo continuará como antes”.
“O fracasso da APEC para realizar um avanço importante em matéria de mudança climática confirma que o lugar para isto será a rodada de negociações de dezembro em Bali”, na Indonésia, acrescentou Fitzptrick, onde acontecerá a conferência das partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática. Os países-membros da APEC, entre os quais estão Austrália, Canadá, China, Estados Unidos, Japão, Indonésia e Rússia, respondem por cerca da metade das emissões mundiais de gases causadores do efeito estufa liberadas pelos transportes, pela geração térmica de eletricidade, pelo desmatamento e pela pecuária, entre outras atividades.
O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, participou da cúpula da APEC e aproveitou a oportunidade para se reunir com seus colegas da China e russa, Hu Jintao e Vladimir Putin, respectivamente, e, ainda, com o primeiro-ministro japonês, Shinzo Abe. A declaração da APEC prepara o terreno para a conferência de Bali e para as negociações que acontecerão este mês em Nova Yorque e Washington entre representantes dos países mais ricos. Em 1997, o Protocolo de Kyoto sobre Mudança Climática estabeleceu metas obrigatórias de redução das emissões para 35 nações industrializadas, mas dos países em desenvolvimento só foi exigido um compromisso de cumprimento desses objetivos.
Austrália e Estados Unidos, dois dos maiores emissores de gases que provocam o efeito estufa, estão fora do Protocolo de Kyoto. Washington o repudiou tão logo Bush chegou à Casa Branca, em 2001. Os dois países se negam a aceitar as medas de redução e insistem que a não inclusão das nações em desenvolvimento é uma falha desse tratado, que entrou em vigor em 2005 e expirará em 2012. Howard havia pressionado por uma declaração da APEC sobre mudança climática, segurança energética e desenvolvimento “limpo” que não estabelecesse metas explicitas ou punições para que não as atingisse.
A declaração se refere ao “objetivo desejável a longo prazo para reduzir as emissões globais de gases que causam o efeito estufa, que sirva como guia para uma efetivo acordo internacional sobre a mudança climática. Todas as economias deveriam contribuir para que essa meta seja atingida, levando em conta as circunstâncias nacionais e permitindo a adoção de políticas baseadas no mercado”. Além disso, os líderes da APEC se comprometeram a fixar “objetivos regionais para reduzir a intensidade do uso de energia e incrementar a superfície de florestas, privilegiando políticas que promovam o crescimento econômico e a redução das emissões”.
A declaração destaca que “as novas tecnologias serão chaves para se conseguir reduções reais e duradouras”. Por outro lado, o texto ressalta a importância da Convenção sobre Mudança Climática, um ponto que o presidente chinês considerou fundamental para chegar-se a um acordo sobre o conteúdo da declaração. Organizações de voluntários como GetUp! (Levante-se!) e Avaaz expressaram satisfação pelo apoio da APEC às negociações sobre o clima no contexto das Nações Unidas, embora denunciem a ausência de metas de cumprimento obrigatório. O diretor-executivo da GetUp!, Brett Solomon, disse que “desgastar as disposições do Protocolo de Kyoto não só converteu a APEC em um fracasso como, também, arrisca seu futuro político. Qualquer acordo que não inclua metas de cumprimento obrigatório falha com nossa região e com o mundo”.
Por sua vez, o diretor de campanhas da Avaaz, Bem Wikler, disse que na cúpula “perdeu-se a oportunidade de as nações desenvolvidas se comprometerem a alcançar metas ambientais obrigatórias. Ao não conseguirem afastar a economia mundial do uso dos combustíveis fósseis, os líderes da APEC estão se convertendo eles mesmos em fósseis”. Na semana passada, os membros da Avaaz e da GetUp! organizaram atividades em mais de cem países para reclamar objetivos obrigatórios. Entre outras coisas, abriram uma bandeira de 144 metros quadrados na praia Bondi e sobre a grande barreira de coral australiana. Também enviaram à cúpula da APEC uma petição com mais de 500 mil assinaturas.
A organização internacional humanitária e de desenvolvimento Oxfam expressou sua preocupação sobre o aumento da pobreza devido à mudança climática. Mais de quatro bilhões de pessoas, representando mais de 60% da população do planeta, vivem na Ásia, metade delas em áreas costeiras. O continente também abriga 87% dos 400 milhões de pequenas fazendas do mundo, muitas delas precisando de ajuda para enfrentar as mudanças climáticas que afetam a produção de alimentos e sua renda. O diretor de políticas da Oxfam James Ensor, disse que “se os membros ricos da APEC só se comprometem com medidas voluntárias, estão enviando uma mensagem pessimista. A União Européia já ofereceu uma redução de 20% até 2020, um bom começo, que deve ser melhorado. A APEC deve emitir um sinal semelhante de que também vai nessa direção”.
Cerca de cinco mil pessoas participaram no sábado de uma manifestação de repúdio à cúpula da APEC no centro de Sidnei. O porta-voz da não-governamental Detenhamos a Coalizão de Bush, Alex Bainbridge, disse que as medidas de segurança sem precedentes que cercaram o encontro constituíram uma “erosão das liberdades civis. Foi outro exemplo da chamada guerra contra o terrorismo, que jamais teve algo a ver com a promoção da democracia”, acrescentou.
A APEC está integrada por Austrália, Brunei, Canadá, Coréia do Sul, Chile, China, Estados Unidos, Filipinas, Hong Kong, Indonésia, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Papúa-Nova Guiné, Peru, Rússia, Cingapura, Tailândia, Taiwan e Vietnã. Seus membros representam um terço da população mundial, 60% do produto bruto do planeta e a metade do comércio internacional.
(Por Neena Bhandari,
IPS, 10/09/2007)