Três comissões técnicas vão debater pontos polêmicos do projeto, como a sedimentação do rio, o impacto sobre a pesca e a saúde da população local; calendário ainda não foi definidoOs possíveis impactos da construção de usinas hidrelétricas no rio Madeira ainda preocupam o governo boliviano. No último dia 23, David Choquehuanca, ministro de Relações Exteriores da Bolívia, e o chanceler brasileiro Celso Amorim acertaram a criação de três comissões técnicas bilaterais para avaliar os efeitos das usinas de Santo Antônio e Jirau, no Estado de Rondônia, sobre o território boliviano. O leilão da primeira usina está marcado para o dia 30 de outubro.
As três comissões vão emitir pareceres sobre a movimentação de peixes migratórios, que pode ser prejudicada com a construção da hidrelétrica, a 80 quilômetros da fronteira; a saúde da população da região, já que há possibilidade de aumento da malária e da febre amarela; e a inundação de áreas bolivianas. Apesar da licença prévia concedida pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) no início do mês, ambientalistas dos dois países alegaram que os estudos de impacto ambiental (EIA) não são consistentes.
Segundo o vice-ministro do Meio-Ambiente da Bolívia, Juan Pablo Ramos, até a tarde desta terça-feira (28) ainda não havia datas previstas para reuniões, mas o calendário de trabalho das comissões está sendo analisado pelos dois países. Ramos explica que o governo boliviano tem dúvidas e quer saber do real impacto do empreendimento além das fronteiras. "Respeitamos a soberania do Brasil, mas este é um problema que envolve os dois países, porque nós também seremos afetados. Temos algumas dúvidas e queremos resolvê-las", diz.
Impactos sociais Na última semana, um grupo de comunidades ribeirinhas, de organizações camponesas e de atingidos por barragens do Estado de Rondônia e da Bolívia se encontrou em Ribalta para discutir suas preocupações em relação ao projeto. Eles criticaram o caráter transnacional do chamado Complexo Madeira, "que dá mostras de boa vontade à abertura ao capital internacional" em detrimento de exigências sociais. Leia o manifesto do encontro (disponível em espanhol).
Em carta aberta no início do ano, os movimentos denunciaram a maquiagem dos dados no EIA relativos à contaminação por mercúrio, a expansão dos focos de malária e das áreas potencialmente inundáveis, além da diminuição dos efeitos de quebra da economia pesqueira por conta do fim dos ciclos migratórios dos peixes. "Inadmissível que se inicie o licenciamento de obras cujos impactos foram deliberadamente mascarados e minimizados pelos propositores do projeto", diz a carta.
Josinaldo Oliveira, do Movimento dos Atingidos por Barragem (MAB), critica a postura do governo com relação às populações ribeirinhas: "a correlação de forças [entre os grupos interessados na construção e os ribeirinhos] é desfavorável, o governo tem atropelado as forças políticas locais", afirma. Ele nega, ainda, o discurso de desenvolvimento da região como forma de justificar as obras: "A usina de Samuel, perto de Porto Velho, é um bom exemplo disso: há 10 quilômetros dali, centenas de famílias ribeirinhas não possuem nem eletricidade. Como isso pode beneficiar a população?".
A portaria do ministério que regulamenta o leilão prevê que a usina começará a gerar energia em 2012. A usina será contratada por 30 anos. Juntas, as duas hidrelétricas somam 6.450 megawatts - aproximadamente metade da potência de Itaipu, a usina mais potente do país, e 8% da demanda nacional.
(Por Fernanda Campagnucci,
Amazonia.org.br, 28/08/2007)