Carta aberta
No dia 16 de agosto de 2007, os membros da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), que aqui subscrevem, decidiram retirar-se da reunião plenária em protesto à forma sumária de votação e aprovação dos Planos de Monitoramento e de Coexistência entre o milho convencional e o transgênico. Ressalte-se que tais planos não tinham sido objeto de análise em maio de 2007, quando da liberação do milho transgênico Liberty Link, da Bayer, por parte da Comissão. Somente foram incluídos, em ultima hora, na pauta da plenária de 19 de julho de 2007 e, ainda assim, planos muito genéricos e permissivos para fazer frente a uma medida judicial que impedia sua liberação. As medidas de biossegurança, que deveriam ter sido elaboradas antes de maio, são fundamentais e necessárias para evitar maiores riscos dos organismos geneticamente modificados (OGMs). Entretanto, a adoção de tais medidas tem sido relegada a um segundo plano, com a pauta das plenárias voltada, predominantemente, para as liberações planejada e comercial.
Nesta segunda plenária, a presidência da CTNBio e a maior parte dos seus membros, técnicos e cientistas da área de biotecnologia, tiveram, mais uma vez, a preocupação prioritária em atender as demandas específicas à biotecnologia, conduzindo o tema de forma rápida e superficial. Assim, não foi permitida a inclusão de nenhuma das propostas apresentadas em dois documentos extensos, que faziam parte de "pedido de vistas" de membros da Comissão. Os Planos aprovados, tanto de Monitoramento quanto de Coexistência, desconsideraram o Princípio da Precaução e, portanto, podem comprometer as variedades de milho, historicamente cultivadas no País, com riscos ambientais e sociais, sobretudo, com possibilidade de prejuízos aos pequenos agricultores. A falta de debate, ilustrada pela não incorporação de nenhuma das muitas propostas apresentadas, reflete uma visão corporativista que não oportuniza o diálogo necessário. Constantemente, nas reuniões plenárias, despreza-se a controvérsia e os múltiplos aspectos de incerteza sobre possíveis riscos à saúde e/ou ao meio ambiente derivados dos OGMs
O acontecimento de votações, como as que ocorreram hoje, é incompatível com uma Comissão formada por doutores, considerados especialistas em biossegurança ou em áreas afins. Tais decisões, submetidas às demandas do mercado, comprometem ainda mais a confiabilidade das decisões da CTNBio. Infelizmente, desde a criação desta Comissão, existe uma assimetria em sua representatividade. A biossegurança torna-se, assim, tema secundário do foco de atenções da Comissão. Este processo se aprofundou, quando da aprovação da medida provisória que derrubou o quorum de 2/3 dos seus membros para as liberações comerciais e outras medidas que acabaram desconstituindo os avanços da Lei de biossegurança no Brasil.
A biossegurança não pode confundir-se com a bandeira explícita de "adotar os transgênicos" no País. Não podemos compartilhar votações que não atendam ao princípio da precaução e aos interesses da sociedade brasileira.
Brasília, 16 de agosto de 2007
* Assinam os membros da CTNBio, Dr. Paulo Brack , Dra. Carmem Marinho, Dra. Magda Zanoni; Dr. Lucas de Souza Lehfeld, Dr. Paulo Kageyama, Dr. Rodrigo Raubach e Dr. Carlos Gustavo Tornquist.
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Adital, 20/08/2007)