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gestão dos recursos hídricos
2007-08-21

A questão dos recursos hídricos atualmente tem se revelado importante dentro do direito ambiental e também das ciências ambientais. Considerando que o Brasil é detentor de cerca de 12% de toda água potável existente no planeta, o que faz com que a sociedade organizada e seus legisladores se preocupem com a proteção jurídica das águas e que a mesma seja colocada em destaque dentro da construção da legislação ambiental brasileira, que pode ser entendida como conjunto de normas jurídicas que reconhecem o ambiente como o bem jurídico a ser protegido.

A água é um bem de domínio público, um recurso natural limitado, dotado de valor econômico, conforme estabelecido nos pressupostos que estão embutidos na Lei Federal nº 9.433 que instituiu a Política Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos - que criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos e que foi aprovada em 8 de janeiro de 1997.

Para atingir o nosso objetivo de ressaltar a efetividade da função socioambiental da propriedade urbana, quer dizer a inserção da defesa do meio ambiente ao lado da função social da propriedade onde caracteriza a função ambiental inerente à propriedade, iremos mostrar as resoluções do Conama nº 302/02 e 303/02. Através deste estudo iremos indicar que o direito de propriedade passará a ser objeto de limitações derivadas da proteção legal do meio ambiente, adquirindo uma nova função, de caráter ambiental, pela qual o seu uso, gozo e fruição deverá garantir a integridade do patrimônio ambiental nela existente.

Desde as mais antigas sociedades, como a egípcia, a hebraica, a babilônica, entre outras, o ser humano sempre dispôs de regras concernentes ao uso da água. As águas doces, há algumas décadas, têm sido motivo de grande preocupação em especial as destinadas ao consumo humano e ao saneamento ambiental conforme podemos ver na publicação do IBGE: Atlas do Saneamento.

Partimos do pressuposto que é preciso considerar que a Política Urbana e a preservação e uso racional dos recursos ambientais do meio urbano são indissociáveis, pois a proteção conferida ao Meio Ambiente pela Constituição da República Federativa do Brasil, a inserção da defesa do Meio Ambiente ao lado da Função Social da Propriedade como princípios da ordem econômica, o preenchimento da lacuna legislativa do Estatuto da Cidade que relacionou normas urbanísticas com a proteção do meio ambiente induz que podemos dizer atualmente que existe a função socioambiental da propriedade privada.

As resoluções Conama nº302/02 e nº303/02 delimitaram pela primeira vez o termo função socioambiental da propriedade. Estas resoluções atinentes às Áreas de Preservação Permanente estabeleceram novas limitações a um direito fundamental, o direito de propriedade. Pretendemos apresentar neste trabalho as normas hoje em vigor no Ordenamento Jurídico Brasileiro que incidem sobre as Áreas de Preservação Permanente e sua relação com a proteção de águas urbanas e o cumprimento da função ambiental da propriedade urbana pois conforme a geógrafa Castello Branco (2003) a respeito do fenômeno urbano:

"A generalização do fenômeno urbano no Brasil, confirmado com a grande proporção de pessoas vivendo em cidades em 2000 (81%), desperta constante interesse acerca do ambiente em que esta população vive".

Para melhor entendimento, o termo preservação permanente impõe um caráter de rigorosa proteção, acentuando a maior relevância dessas áreas para o equilíbrio ecológico do sistema. Tal função ambiental projeta-se no campo da higidez dos recursos hídricos, da preservação das paisagens naturais, da proteção da biodiversidade, da preservação da estabilidade geológica, da garantia do fluxo gênico da fauna e da flora, da proteção do solo e da promoção do bem-estar da coletividade.

Foi instituída, no âmbito do Conama, Câmara Técnica referente à atualização do Código Florestal, contando com um Grupo de Trabalho específico sobre Áreas de Preservação Permanente e Áreas Urbanas Consolidadas, que inclusive, elaborou resolução que explicita critérios técnicos para Área de Preservação Permanente no Meio Urbano, define atividades, projetos e obras de interesse social e utilidade pública no espaço construído. Cabe destacar que o conceito de área urbana consolidada encontra-se disposto no inciso XIII do artigo primeiro da Resolução do Conama 303/02, conforme segue:

"XIII - área urbana consolidada: aquela que atende aos seguintes critérios:
a) definição legal pelo poder público;
b) existência de, no mínimo, quatro dos seguintes equipamentos de infra-estrutura urbana:
1. malha viária com canalização de águas pluviais,
2. rede de abastecimento de água;
3. rede de esgoto;
4. distribuição de energia elétrica e iluminação pública;
5. recolhimento de resíduos sólidos urbanos;
6. tratamento de resíduos sólidos urbanos; e
c) densidade demográfica superior a cinco mil habitantes por km2".

Deve-se destacar que a Resolução refere-se a Áreas de Preservação Permanente, enquanto que o artigo 2 do Código Florestal dizia serem de preservação permanente florestas e demais formas de vegetação. Assim, as Áreas de Preservação Permanente não estão mais vinculadas à existência ou não de vegetação ou floresta, caracterizando-se como espaços e ambientes com função ambiental específica.

No que se refere às Áreas de Preservação Permanente que se destinam à proteção de recursos hídricos, destaca-se que a Resolução Conama 303/02 trouxe modificações no que se refere àquelas destinadas à proteção de lagos e lagoas naturais, destacando-se que não se refere aos reservatórios artificiais, citados no artigo 2° do Código Florestal, pois os mesmos são objeto da Resolução Conama 302/02. Assim, no que denomina de áreas urbanas consolidadas, estabelece a Resolução 303/02 uma faixa mínima de trinta metros no entorno de lagos e lagoas naturais.

Outro critério é estabelecido no parágrafo 5° da Resolução Conama 302/02 para os casos de redução de APP, hipótese na qual "a ocupação urbana, mesmo com parcelamento de solo através de loteamento ou subdivisão em partes ideais, dentre outros mecanismos, não poderá exceder a dez por cento dessa área, ressalvadas as benfeitorias existentes na área urbana consolidada, à época da solicitação da licença prévia ambiental".

Justificando a prática de instrumentos da política nacional de meio ambiente devemos ressaltar o parágrafo 2° do artigo 4 do Código Florestal que fora acrescentado pela Medida Provisória n° 2.080-63/01, de 17 de maio de 2001 que diz:

"A supressão de vegetação em área de preservação permanente situada em área urbana, dependerá de autorização do órgão ambiental competente, desde que o município possua conselho de meio ambiente com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico".

Este parágrafo refere a autorização para supressão de florestas de preservação permanente em áreas urbanas. Apesar de o Município ter competência para legislar sobre assuntos de interesse local (CRFB, art. 30, I), para autorizar o desmatamento excepcional a lei impõe condições. Exige que essa entidade federativa tenha conselho de meio ambiente e plano diretor. Além disso, exige também a anuência prévia do órgão ambiental estadual competente. São exigências justificáveis porque os Municípios são mais vulneráveis às pressões econômicas e a interesses políticos locais que muitas vezes extrapolam a moralidade administrativa. Não ofendem a autonomia municipal porque a defesa do meio ambiente é obrigação de toda a sociedade (CRFB, art. 224).

Conforme foi explicado acima podemos dizer que a função ecológica do direito de propriedade opera como fator legitimador da imposição de restrições ao seu uso, tais como a instituição de áreas de preservação permanente e de reservas florestais legais. Em verdade, a utilização racional e adequada dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente constituem elementos condicionadores da legitimidade do direito de propriedade, balizando o cumprimento de sua função social. Daí resulta a expressão função socioambiental, a significar que o direito de propriedade deve ser exercido de modo a que não sejam malferidos os interesses da coletividade no que tange à promoção do meio ambiente saudável e ecologicamente equilibrado.

Considerações finais
Verifica-se através da nossa pesquisa que essas resoluções recentes do Conama regula o regime jurídico da propriedade, mediante a consagração do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e a exigência do cumprimento de uma função social. O perfil individualista e liberal da propriedade está sendo superado pela concepção de interesses sociais preponderantes, de sorte que hoje a propriedade privada possui um conteúdo formado tanto pelo direito subjetivo, assegurando no artigo 524 do Código Civil, como pelos ditames constitucionais de observância da função social e também das resoluções do Conama no tocante a função ambiental.

Com a passagem do Estado Liberal para o Estado Social e na era de transição para o Estado de Direito Ambiental, a propriedade tende a traduzir um direito cujo exercício em prol da sociedade apresenta interesse público relevante. Desta superação de paradigma, decorre a necessidade de se compatibilizarem os princípios constitucionais mediante a ponderação de valores, sendo que o valor ambiental, por ser de interesse público e difuso, não pode ser suplantado pelos interesses privados do proprietário. Destes esforços de integração do sistema jurídico decorre o princípio da função socioambiental da propriedade, que, em última análise, objetiva prevenir a degradação da qualidade ambiental.

Concretizar essa nova visão sobre a propriedade (que no Estado liberal passou de mero direito de propriedade para também ser aceita como direito de propriedade) é tarefa em construção, conforme observado na proteção jurídica das águas em ambiente urbano, sempre dificultada pelas constantes tensões entre o anseio pelo uso (tantas vezes nocivo ou abusivo) da propriedade e a proteção ambiental.

Essa proteção jurídica das águas vem de encontro ao discurso ecumênico de espiritualidade das águas que considera a água como possuindo um significado social, cultural, medicinal, religioso, além do econômico.

Termino com a oração a Yemanjá : "Vós que governais as águas, derramai por sobre a humanidade a vossa proteção, fazendo assim, ó Divina Mãe, uma descarga em seus corpos materiais, limpando suas águas e incutindo em seus corações, o respeito e a veneração devida a essa força da natureza que simbolizais. Fluidificai nossos espíritos e descarregai nossa matéria de todas as impurezas que ajam adquirido. Permiti, que vossas falanges nos protejam e amparem, assim o fazendo com toda a humanidade, nossa irmã. Salve Yemanjá".

Bibliografia
BARROS, Marcelo. O espírito vem pelas águas. São Paulo. Edições Loyola-Rede. 2003.
CASTELLO BRANCO, Maria Luisa Gomes. Espaços urbanos: uma proposta para o Brasil: tese apresentada ao curso de Doutorado em Geografia do Programa de Pós-Graduação em Geografia o Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro. UFRJ. 2003.
IBGE: Coordenação de Geografia. Atlas do saneamento. Rio de Janeiro: IBGE. 2004.
JACOBS, Michael. O meio ambiente, a modernidade e a terceira via. In: GIDDENS, Anthony (org). O debate global sobre a terceira via. São Paulo. Ed. UNESP. 2006.
PACHECO, Regina Silvia et al. Atores e conflitos em questões ambientais urbanas. In: VIEIRA, Paulo F. e MAIMON, Dália. As ciências sociais e a questão ambiental: rumo à interdisciplinaridade. Rio de Janeiro-Belém: APED-UFPA. 1993.
POMPEU, Cid Tomanik. Direito de águas no Brasil. São Paulo. Ed. Revista dos Tribunais, 2006.

(Por Jorge Kleber Teixeira Silva, geógrafo da Coordenação de Geografia do IBGE, Adital, 17/08/2007)


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