O Bioma Pampa abrange áreas de três países - Argentina, Brasil e Uruguai - e se transformou recentemente em um pólo mundial para o plantio de eucaliptos e produção de celulose. Trata-se de uma fisionomia natural que já perdeu, no Rio Grande do Sul, cerca de 60% de sua vegetação nativa original, segundo levantamento recente da UFRGS/Ministério do Meio Ambiente. Apesar da magnitude e dos potenciais impactos da implantação deste novo pólo econômico no estado, principalmente na Metade Sul, área do Bioma Pampa, este tema não tem sido discutido da forma que mereceria.
O que se assistiu nas audiências públicas do Zoneamento Ambiental da Silvicultura, por exemplo, não foi uma discussão em que primassem questões técnicas ambientais ou mesmo sociais e econômicas, mas sim a ressurreição de posições pré Estocolmo 1972 - a 1° Conferência Mundial sobre Meio Ambiente realizada na Suécia - baseadas num falso dilema empregos e desenvolvimento versus meio ambiente.
Aqueles que defendem o Zoneamento da Silvicultura elaborado pela FEPAM/FZB foram principalmente acusados de serem contra o desenvolvimento da Metade Sul do estado, como se o Zoneamento não buscasse justamente garantir que o modelo de desenvolvimento ora em discussão em torno da silvicultura seja implantado de forma planejada, duradoura e sustentável. Ou alguém gostaria de ver os impactos negativos da implantação em grande escala da silvicultura em outros estados do país se repetirem no RS? Os exemplos do Espírito Santo e da Bahia nesta matéria são eloqüentes e didáticos em relação à mata atlântica.
No sentido de colaborar com esta discussão, o IBAMA/RS, por meio de seu Grupo de Trabalho do Bioma Pampa, analisou e emitiu parecer favorável ao Zoneamento proposto pela FEPAM/FZB. Tal posição, obviamente, não significa que a proposta apresentada não possa ser aperfeiçoada em determinados pontos.
Outro fato lamentável: o linchamento público dos técnicos da FEPAM e FZB. Tachados como inimigos do desenvolvimento por muitos, sofreram intimidações, ofensas e constrangimentos. Não surpreende, assim, os alegados 95% de manifestações contrárias ao Zoneamento verificadas nas audiências.
Preocupam ainda as estratégias utilizadas por alguns para, assim como ocorreu na discussão dos transgênicos, “ideologizar” a discussão, como forma de desqualificar aqueles que defendem o Zoneamento, tachando-os de atrasados, anti-desenvolvimentistas ou mesmo associando-os a determinados movimentos sociais ou partidos políticos, numa tentativa de estigmatizá-los e isolá-los, dando contornos políticos a uma questão que é, ou deveria ser, fundamentalmente técnica. É clara a tentativa de desvirtuar e simplificar uma discussão técnica mas que, obviamente, tem aspectos ideológicos inerentes à atividade econômica discutida.
Observa-se, por parte de determinados setores, não uma vontade de contribuir, discutir, construir consensos, mas sim de desconstituir, postergar, desqualificar por completo um documento que, por muitos dos que criticam, certamente não foi nem lido. O radicalismo, a passionalidade e o uso político-partidário por parte tanto daqueles contrários quanto aqueles favoráveis ao Zoneamento só trazem prejuízos a um debate que deveria se dar de uma forma séria e madura.
Em que pesem as iniciativas para desqualificar e postergar a adoção de um Zoneamento Ambiental para a Silvicultura no Estado, o mesmo representa uma oportunidade única para que o RS garanta a conservação e o uso sustentável do Pampa gaúcho, paisagem que, no Brasil, e não custa lembrar, só existe aqui.
(Por Marcelo Machado Madeira(*),
Ambiente Brasil, 20/08/2007)
* É ecólogo e analista ambiental, chefe da Divisão Técnica do IBAMA/RS e coordenador do Grupo de Trabalho do Bioma Pampa na Superintendência.