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crise da água
2007-08-21
Enquanto o mundo enfrenta novas ameaças de escassez de água, desatadas por fenômenos como o aquecimento global e as demandas de bioenergia, Cingapura e Iraque são apontados com dois extremos em matéria de administração hídrica. Cingapura, a diminuta cidade-Estado de 4,5 milhões de habitante, é apresentada como um grande êxito, apesar da ausência de recursos naturais. Já o Iraque é descartado por ser considerado um grande fracasso, embora conte com dois importantes rios. O sucesso amplamente reconhecido de Cingapura em relação às políticas hídricas deu a esta nação do sudeste da Ásia o prêmio Água da Indústria de Estocolmo, por ocasião da Semana Mundial da Água, encerrada no sábado na capital sueca.

“Nos asseguramos de que nosso fornecimento hídrico seja sustentável pelos próximos cem anos, ou mais”, disse Khoo Teng Chye, principal executivo da agência nacional da água de Cingapura. Isto teria sido imaginado nos anos 60 e 70, quando Cingapura enfrentou todos os problemas da urbanização rápida: escassez de água, rios contaminados e conseqüentes inundações. “Em 10 anos, os rios foram limpos. O Cingapura ficou livre de contaminação e está repleto de peixes”, disse Chye na cerimônia de entrega do prêmio durante a conferência patrocinada pelo Instituto Internacional da Água de Estocolmo.

Cingapura, que antes dependia principalmente da vizinha Malásia para obter água, agora tem três fontes adicionais: coleta das bacias locais conhecidas como as Quatro Torneiras Nacionais, bem como a reciclagem e a dessalinização das águas do mar. As quatro unidades recicladoras de Cingapura atendem 15% das necessidades hídricas da cidade-Estado. Para daqui a três anos se planeja criar uma quinta que, junto com as demais, atenderá 30% da demanda de água. “Todos os países industrializados podem aprender em Cingapura qual é a melhor maneira de administrar eficiente e eqüitativamente o fornecimento hídrico urbano e os sistemas de manejo de esgotos”, disse o professor Asit Biswas, do Centro do Terceiro Mundo para Manejo de Água, com sede no México.

Após assinar um novo acordo de associação com Cingapura para promover em conjunto o manejo seguro da água potável no âmbito global, a diretora-geral assistente da Organização Mundial da Saúde, Susanne Weber-Mosdorf, disse que “Cingapura é um modelo de manejo integrado da água”. Por isso, “a OMS espera trabalhar de perto com esse país para compartilhar essa perícia em administração hídrica com seus Estados-membros”, acrescentou.

Em contraste com Cingapura, o Iraque tem abundante água doce, procedente de dois importantes rios, Tigre e Eufrates. Mas este país, rico em recursos naturais e com vastas reservas de petróleo, enfrentou vários anos de conflitos.

Entre eles, uma guerra com o vizinho Irã (1980-1988), a invasão liderada pelos Estados Unidos em 20 de março de 2003 e a posterior ocupação, bem como violência sectária. Com resultado, segundo a Organização das Nações Unidas, o setor hídrico do Iraque “sofreu uma importante deterioração em anos recentes”. Os fatores que contribuiram para isto incluem uma séria falta de coordenação entre vários organismos públicos, pouca capacidade de implementar um plano nacional de recursos hídricos, o fato de que esses recursos estão cada vez mais esgotados e a degradação ambiental.

“Uma demonstração surpreendente de sua má administração é que 90% dos recursos hídricos do Iraque atualmente são usados para agricultura, enquanto ainda importa a maioria de seus produtos agrícolas”, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Uma conferência de doadores realizada em maio na Jordânia destacou os principais desafios no Iraque e propôs um plano de ação a longo prazo para minimizar a crise hídrica nesse país devastado pela guerra.

“A fim de reverter esta tendência, é essencial potencializar a capacidade do governo para coordenar e desenvolver uma estratégia integrada de manejo de recursos hídricos”, disse Paolo Lembo, diretor do Pnud para o Iraque. “É verdade que atualmente o Iraque enfrenta importantes desafios humanos, mas nossa responsabilidade não é apenas responder às terríveis realidades do presente, mas também assentar as bases para um futuro desenvolvimento sustentado”, acrescentou Lembo.

Em um estudo divulgado em Estocolmo, a Unidade de Pesquisas Internacionais sobre Serviços Públicos, com sede na França, destacou que a África do Sul, como Cingapura, é outro país no caminho correto para conseguir uma efetiva administração da água. Em 1994, com o fim do apartheid (regime de segregação racial em detrimento da maioria negra do pais), cerca de 15,2 milhões (38%) dos 40 milhões de sul-africanos careciam de acesso a um fornecimento básico de água.

Os governos pós-apartheid construíram uma infra-estrutura que atende as necessidades de quase 10 milhões de habitantes rurais. E até 2009 espera-se que a África do Sul atenda as necessidades básicas de todo país. O estudo indica que qualquer tentativa realista de desenvolver serviços hídricos em países de renda média e baixa deve centrar-se no setor público. “Apesar de toda a atenção dada à privatização da água nos últimos 15 anos, os serviços hídricos do mundo continuam sendo fornecidos em sua maioria esmagadora pelo setor público”, afirma o documento.

Em nações de renda média e baixa, 90% das cidades com mais de um milhão de habitantes eram abastecidas, até meados de 2006 por um operador do setor público. “Este predomínio do setor público está crescendo, na medida em que as empresas privadas se retiram de muitas das concessões e dos contratos em países em desenvolvimento”, diz o informe. Em áreas rurais, onde há poucos negócios lucrativos para as companhias privadas, a porcentagem de serviços hídricos proporcionados pelo setor público é de quase 100%.
(Por Thalif Deen, IPS, 20/08/2007)


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