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biocombustíveis política energética
2007-08-17
Criou-se um debate equivocado sobre os impactos da ampliação da produção de energias renováveis e limpas vegetais sobre a produção de alimentos, como se a fome e a miséria fosse decorrente da falta de alimentos e pela ocupação das áreas de produção de alimentos pelas energias vegetais. Na realidade, o mundo produz 30% mais alimentos do que necessita segundo indicação da FAO. Esse alimento porém não é acessível para os que têm fome, os excluídos. Não adianta portanto produzir mais alimentos para suprir aos famintos pois estes não têm meios para adquiri-los devido a um modelo econômico opressor e desigual.

Enquanto isto, segundo a FAO, somente no Brasil existem 80 milhões de hectares de terras agriculturáveis ociosas, terras sem produção. As indicações do IBGE dão valores muito maiores. Se essas terras fossem usadas para a produção de alimentos, isso em nada adiantaria para superar a situação atual de um grande número de seres humanos vítimas da fome. Eles não dispõem de poder de compra, por desemprego, má distribuição da renda, falta de políticas públicas de efeitos sociais positivos e muitas outras razões, que são o fruto de um modelo econômico perverso, socialmente excludente.

Se criarmos condições para dar trabalho e renda à maioria desses excluídos, a situação mudaria de modo substantivo. Assim, as imensas potencialidades de mercado criadas pelo ocaso do petróleo, de sua possível substituição pelas energias vegetais produzidas por pequenos produtores em países ditos pobres, visando a superação do colapso dos combustíveis fósseis controlados pelos países ricos, a situação tenderia a provocar mudanças muito positivas do ponto de vista social e econômico.

Isso exige porém mudanças no modelo opressor imposto pelos ricos e apoiado pelo setor financeiro do governo. O poder institucional de controle exercido por corporações estrangeiras dos países ditos ricos sobre esses combustíveis fósseis é avassalador, embora esses combustíveis estejam em declínio e esses países apresentem fraturas irreversíveis que podem ser superadas pela produção energética de países pobres, especialmente nas regiões tropicais do planeta, muito ricas em energias renováveis. A situação de ocaso dos fósseis, não renováveis e sujos do ponto de vista ambiental, ademais, leva o mundo à guerra, visando o domínio do que resta das reservas de petróleo.

O contrário ocorre com as energias vegetais renováveis que duram enquanto houver radiação solar e têm assim uma longa perspectiva histórica de promoção da paz. Esta excepcional perspectiva somente se transformará em realidade se for mudado o modelo de domínio absoluto dos países ricos sobre os pobres por meio do capital financeiro, que emitem de modo arbitrário. Esses países são carentes de potenciais energéticos naturais, tendo origem no grande manancial que é o Sol. É o confronto entre o artifício de um sistema monetário decadente e insustentável e a pujança da natureza de um sistema sustentável, baseado na fusão nuclear, somente possível nas condições de elevadíssimas temperaturas alcançadas nos núcleos das estrelas, astros com luz própria. O Sol, a nossa estrela, é o único reator a fusão nuclear possível no nosso sistema planetário, parte essencial da natureza e de conseqüências energéticas predominantes nos trópicos.

Como o único continente tropical, o Brasil pode assumir ante o mundo a postura consciente e concreta ao afirmar, em linguagem popular: “*o Sol é nosso”. *Complementando: o sol e as agroenergias, substitutas vantajosas das fósseis em declínio e provocadoras do aquecimento global tão danoso para as futuras condições ambientais do planeta, conforme atesta os dramáticos relatos recentes da comissão especializada das Nações Unidas. Não é por meio da fissão nuclear, Angra III, que produz calor e não enfrenta o colapso dos combustíveis líquidos derivados do petróleo, que iremos encaminhar as soluções dos problemas energéticos mundiais.

O Brasil lidera nesse campo uma nova civilização, a da fotossíntese, que transforma a energia solar, de complexo uso direto, em energias vegetais de fácil produção por pequenos produtores rurais. Nessas condições podem ser montados pólos de produção envolvendo dezenas de milhares de produtores e milhões de novos postos de trabalho, tendo como exemplo o pólo que está sendo implantado na região de Palmeira das Missões, RS, envolvendo cerca de 60 mil pequenos produtores, em 22 municípios. É possível assim criar-se um grande número de pólos tendo por base a agricultura familiar, que responde com eficiência pela implantação de micro usinas de álcool com tecnologia altamente eficiente que produz álcool com custos baixíssimos por meio da produção simultânea de vários produtos de elevado valor agregado. Com o uso do bagaço de cana e vinhoto dessas usinas consegue-se alimentar 80 cabeças de gado confinado que produzem adubo orgânico de grande importância na agricultura, que substituem os fertilizantes industriais.

É necessário porém o apoio do Estado brasileiro por meio de uma empresa de economia mista para a área das energias renováveis, a Empresa Brasileira de Agroenergias (EBA), para apoiar os pequenos produtores naquilo que eles não têm condições de executar. Essa empresa é absolutamente necessária para apoiá-los na gestão de um grande número de produtores rurais, no desenvolvimento tecnológico permanente e na distribuição, especialmente nas exportações para mercados de elevados potenciais que surgem como decorrência do declínio do petróleo, do qual dependem de modo vital, como Japão, Alemanha, China e vários outros.

Dito isto, cabe ao povo brasileiro assumir sua vocação essencial para garantir um futuro de tranqüilidade para a humanidade, somente possível com um Estado que represente com altivez e responsabilidade o seu povo. O mundo nos observa atento, surpreso e com grandes esperanças para um futuro em que o Brasil assuma sua vocação natural. Estamos porém sem instrumentos operativos que nos permitam assumir tão grande responsabilidade e tão vantajosos efeitos sociais e econômicas O Estado é a instituição que executa o projeto de um povo seguindo suas vocações naturais. Daí o projeto em marcha dos povos hoje hegemônicos que desejam enfraquecer o Estado brasileiro pela transferência de suas principais instituições e domínio territorial para o controle estrangeiro. Duas questões estratégicas que comprometem a soberania nacional e a libertação do País da dependência externa.

Cabe-nos assim reagir com denodo e inteligência, em nome da dignidade nacional, tendo um projeto que redima o nosso povo da miséria que o oprime, tendo por base nossos excepcionais fatores comparativos naturais.

(Por José Walter Bautista Vidal*, Agencia Carta Maior, 16/08/2007)
* José Walter Bautista Vidal é físico e engenheiro, ex-Secretário de Política Industrial dos governos Geisel e Sarney. Foi professor da Unicamp e da UnB.

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