Desde terça-feira, um incêndio vem queimado o aterro do lixão da Caturrita, no distrito de Santo Antão, em Santa Maria. A estimativa de catadores é que metade da área tenha sido consumida pelo fogo. A PRT, administradora do lixão, fala em um terço do local queimado. Além do fogo, o que preocupa é a fumaça densa e tóxica (por conta da queima de materiais como borracha, plástico e lâmpadas).
Segundo os bombeiros, o fogo que começou por baixo das pilhas de lixo deve ter sido provocado pelas altas temperaturas dos últimos dias. O vento forte teria colaborado para espalhar as chamas. Com o calor fora de época, o gás liberado pelo chorume (líquido produzido pela decomposição do lixo), que tem cerca de seis metros de profundidade, teria entrado em combustão.
- Não há labaredas altas nem fogueiras. A combustão é praticamente sem chamas, mas bem potente - explica o capitão Gerson da Rosa Pereira, comandante do Subgrupamento de Combate a Incêndio da cidade.
O combate ao fogo começou ontem à tarde, depois de uma reunião com representantes dos bombeiros, da PRT e da Secretaria Municipal de Proteção Ambiental. A ação é delicada porque os caminhões de bombeiros não podem entrar no lixão, já que há risco de atolarem no chorume.
Conforme Pereira, o primeiro passo é escavar para achar o foco do incêndio e, só depois, resfriar a área com água. É preciso muita água porque o gás produzido pelo lixo tem alto poder de alimentar o fogo. A esperança dos bombeiros é que a chuva prevista para hoje seja abundante. Se isso ocorrer, a água que penetrar no lixo deve chegar ao foco das chamas.
Ontem à tarde, duas retroescavadeiras da PRT começaram a escavação, mas o trabalho parou à noite. As máquinas devem voltar hoje. Para o chefe do escritório do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), Tarso Isaía, não há riscos de explosão.
Risco Nem mesmo a densa e tóxica fumaça afastou os catadores - idosos, adolescentes e até crianças - do seu ganha-pão. Com camisetas protegendo o rosto ou de cara limpa, eles seguem trabalhando no local, mesmo preocupados com o perigo de intoxicação.
- Não posso me dar ao luxo de escolher se quero respirar essa fumaça ou não. Dependo disso para comer - disse um jovem que preferiu não se identificar.
Até ontem, a prefeitura não havia decidido se proibia ou não a entrada de catadores no local.
- É uma situação delicada porque o pessoal precisa do material que cata no lixão para sobreviver - polemiza o secretário de Proteção Ambiental, Carlos Rempel.
*Colaborou Fernanda Meneghel
MaisControladoO incêndio que ocorreu na quarta-feira na sede da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro) está controlado. Alguns focos levaram equipes dos bombeiros ao local na madrugada e manhã de ontem, mas não há mais risco de propagação das chamas. Foram queimados 120 dos 542 hectares da propriedade. Além de devastar campo e floresta, as chamas destruíram o hábitat de veados, pássaros e outros animais
Um problema que se arrastaO incêndio no lixão é apenas um dos muitos desdobramentos de um problema antigo e grave. O vaivém de documentos e a pendenga judicial entre prefeitura e Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam) se estende desde 2002. O maior entrave para que a área seja desativada - ela é irregular - , e o lixo seja colocado em um local adequado, é abertura da licitação que escolherá a empresa que vai fazer a coleta, o transporte e a destinação do lixo da cidade.
Uma licitação chegou a ser aberta no começo deste ano, mas o edital foi extinto porque uma das empresas participantes entrou com recurso na Justiça. Desde então, o processo está emperrado. Conforme a prefeitura, o novo edital deve sair até o final deste mês. A nova empresa deve assumir o serviço até 1º de janeiro de 2008 se não houver outro tipo de entrave. Confira a toda a novela do lixão no quadro ao lado.
Novela sem fim2002- Setembro - Prefeitura renova termo de compromisso estabelecido em 1995 em que se compromete em fazer 14 ações. A mais importante é apresentar locais para um novo aterro
- Outubro - PRT vence licitação para continuar fazendo a coleta do lixo e se compromete em fazer uma usina para separar materiais recicláveis
2005- Fevereiro - Prefeitura planeja impermeabilizar terreno perto do lixão e cobrir o lixo com argila até construir um novo aterro
- Abril - Fepam pede na Justiça a interdição imediata do lixão e a retirada dos catadores do local
- Maio - Justiça aceita pedido da prefeitura de construir dois depósitos provisórios, que dependem de liberação da Fepam. Eles deveriam ser construídos em dois meses, com vida útil de até 18 meses - prazo que a prefeitura tinha para construir o aterro definitivo
- Cerca de 180 famílias de catadores são expulsas do lixão. Prefeitura monta um esquema de fornecimento de cestas básicas por 90 dias e colocação dos filhos de catadores na escola. Onze dias depois, 80 catadores voltam ao lixão
- Prefeitura e projeto Esperança/Cooesperança formam a Associação Vida Nova, no horto municipal. Só 35 pessoas se associam ao projeto
2006- Março - Prefeitura encerra atividades no horto, e os catadores voltam ao lixão
- Novembro - Vence o prazo para a construção do novo aterro
2007- Maio - Fepam faz vistoria no lixão e constata que nada mudou. Prefeitura informa que mandou um fiscal ao local, que não teria apontado nenhuma irregularidade
- Agosto - O lixo da cidade continua sendo depositado na Caturrita. Cerca de 200 famílias tiram o sustento de lá
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Diário de Santa Maria, 17/08/2007)