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2007-08-15
Entrevista: Fernando Livi, climatologista

Professor do setor de Climatologia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Fernando Pohlmann Livi estuda mudanças no clima do Estado há 12 anos. Embora concorde que o cidadão comum e as empresas precisam fazer sua parte para frear o aquecimento global, o pesquisador aposta em ações em larga escala, como reflorestamentos, para solucionar o problema.

Pioneiro: Quais os sintomas do aquecimento global que podem ser percebidos na Serra?

Fernando Pohlmann Livi: Os sintomas ainda são sutis, mas muito significativos. As temperaturas noturnas têm aumentado nos últimos anos. Isso resulta na sobrevivência de mosquitos como o da dengue, conforme percebemos no início do ano no Estado. Além disso, houve redução de 60% das geadas nos últimos 30 anos. Isso altera o equilíbrio do meio ambiente e as conseqüências vão desde o impacto em certas culturas agrícolas até catástrofes naturais.

Pioneiro: Catástrofes recentes ocorridas na região (em 2003, tornados atingiram Antônio Prado e São Francisco de Paula e, em 2005, Muitos Capões) são relacionados com o aquecimento global?

Livi: Não temos dados estatísticos para afirmar isso. Mas, caso o aquecimento continue, a probabilidade da ocorrência de tornados e outras calamidades é bem maior. O número de dias chuvosos aumentou em torno de 20% nos últimos 10 anos.

Pioneiro: Como o tema está sendo tratado pelo meio científico gaúcho?

Livi: Infelizmente temos poucos recursos para captar dados e estudar as variações de clima no Estado. São poucas estações climatológicas sendo feitas e as que existiam, como a de São Francisco de Paula, que é uma área estratégica, pararam de funcionar.

Pioneiro: O que fazer para frear o aquecimento global?

Livi: Precisamos reflorestar mais e investir na recuperação de áreas próximas aos rios. Precisamos manter o solo úmido e captar carbono da atmosfera (as árvores absorvem e usam o gás carbônico na fotossíntese). Só com uma alteração significativa do uso do solo é que podemos impactar positivamente no meio ambiente.

Pioneiro: E a redução da poluição?

Livi: Sempre será necessário poluir menos, mas nosso Estado não tem pólos industriais tão violentos. A legislação já é muito severa e acho que não temos grandes problemas.

Pioneiro: Mas acontecem tragédias, como a do Rio dos Sinos (milhares de peixes morreram devido ao despejo de efluentes industriais em setembro de 2006), por exemplo.

Livi: Isso é verdade, embora não seja resultado de poluição atmosférica. Mas acredito que o melhor impacto para a redução do aquecimento é o reflorestamento. Precisaríamos reflorestar pelo menos 20% do Estado.

Pioneiro: E o que o cidadão comum deve fazer?

Livi: Consumir menos produtos industrializados e com muita embalagens e procurar comprar de empresas que fazem compensações, como reflorestamento. Outra ação é eleger administradores públicos realmente preocupados com o meio ambiente.

Seja parte da solução
Segundo os cientistas, cada habitante da Terra gera uma média de sete toneladas de gás carbônico (CO2) por ano com práticas comuns como ligar o carro, imprimir um documento ou comer carne. Nas atividades do dia-a-dia, somos responsáveis por 0,9% das sete gigatoneladas de CO2 jogadas por ano na atmosfera. O número é comparado com o total das emissões originadas por fenômenos como vulcões e incêndios florestais. Para compensar os efeitos dessas emissões, cada pessoa deveria plantar 38,9 árvores por ano.
Confira algumas mudanças de hábitos com as quais você pode ajudar o planeta:
- Ao comprar produtos de madeira, procure o selo FSC (Conselho Brasileiro de Manejo Florestal). O selo certifica que a madeira não é proveniente de desmatamentos ilegais, principais responsáveis pelas emissões de gases no Brasil.
- Prefira o transporte público. É preferível um ônibus gerando poluição do que dezenas de automóveis particulares. Se puder, use bicicleta e exija que as prefeituras invistam em ciclovias. Um carro emite, em média, meio quilo de CO2 a cada 1,5 quilômetro.
- Mantenha seu carro revisado para que o consumo seja o menor possível. Os pneus estando bem calibrados economizam cerca de 3% de combustível (a cada quatro litros de combustível, nove quilos de CO2 são emitidos). Ao comprar, opte pelos veículos bicombustíveis e dê preferência para o álcool, que é menos poluente.
- Procure comprar eletroeletrônicos eficientes em consumo de eletricidade. Troque lâmpadas incandescentes por fluorescentes compactas (uma fluorescente economiza 68 quilos de carbono por ano). Se puder, instale painéis solares para o aquecimento da água. Caso use o chuveiro elétrico, procure tomar banho morno, dessa forma cada pessoa pode economizar 160 quilos de CO2 (emitido na geração da energia elétrica) por ano.
- Consuma menos carne. Para produzir um bife de 200 gramas de carne bovina, um animal consome três mil litros de água. No Brasil, 70% das pastagens são antigas áreas desmatadas. Além disso, os dejetos do rebanho emitem metano, cerca de 20 vezes mais poluente do que o CO2. Estima-se que essas emissões são maiores do que as de todos os veículos do país.
- Coloque uma garrafa pet dentro da caixa d´água do vaso sanitário (se houver). Ela diminuirá o volume do reservatório e economizará dois litros de água a cada descarga.
- Evite produtos com muita embalagem. Você pode poupar 545 quilos de CO2 se reduzir o lixo em 10%.
- Ajuste o termostato da geladeira. Apenas dois graus para cima podem poupar cerca de 900 quilos de CO2 por ano.
- Antes de imprimir documentos, pense se é mesmo necessário. Em média, uma pessoa gasta em papel o equivalente a duas árvores por ano.
- Informe-se, crie grupos de discussão e promova palestras. A educação ambiental garante um mundo melhor para as gerações futuras.
Fontes: Greenpeace, WWF, Ambiente Brasil, documentário A Carne é Fraca

A cronologia do tempo
- O consumo dos recursos naturais e a produção de resíduos, iniciados na Pré-história com a descoberta do fogo, aumentaram de 2,5 mil Kcal de energia produzidas diariamente pelo homem primitivo, para 250 mil Kcal no final do século passado. O primeiro salto do consumo humano e da quantidade de poluição se deu no século XVIII, em função da Revolução Industrial.
- 1827 - O físico e matemático francês Jean-Baptiste Fourier foi o primeiro a considerar que o planeta estava aquecendo em função de gases retidos na atmosfera. Batizou o fenômeno de "efeito estufa".
- 1958 - No período pós-guerra, o químico americano Charles David Keeling alertou sobre o aumento do nível de gás carbônico na atmosfera pelo uso de combustíveis fósseis.
- 1979 - A Academia Nacional de Ciências americana prova que o efeito estufa é responsável pelo aquecimento global e faz um alerta: "uma política de esperar para ver pode significar esperar até que seja tarde demais".
- 1988 - A Organização das Nações Unidas (ONU) cria o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, a sigla em inglês). Cientistas do mundo todo são convocados para analisar e propor soluções para reduzir o efeito estufa.
- 1990 - Publicado o primeiro relatório do IPCC demonstrando o aumento da emissão de gases causadores do efeito estufa e, por conseqüência, do aquecimento global.
- 1992 - A Eco-92, no Rio de Janeiro, cria a Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática que clama que as empresas reduzam voluntariamente a emissão de gases poluidores.
- 1995 - O segundo relatório do IPCC relata o contínuo aumento nas emissões de poluição e, sugere que a influência humana é a principal causa do aquecimento do planeta.
- 1997 - 141 países assinam o Protocolo de Kyoto, no Japão. É criado o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), exigindo que os países reduzam, até 2012, 5,2% das emissões de gases em relação aos níveis de 1990. A economia mundial passa por mudanças com o lançamento do Mercado de Créditos de Carbono (MCC). O novo mercado permite que projetos de preservação do meio ambiente sejam financiados por países que não reduzirem seus níveis de poluição.
- 2001 - Após o registro de que os anos 1990 foram os mais quentes, o IPCC lança seu terceiro relatório. Ainda sem calcular os efeitos na vida do planeta, os cientistas declaram que a temperatura em 2100 poderá aumentar em até 5,8 graus centígrados e que os níveis dos oceanos deverão subir em até 88 centímetros.
No mesmo ano, o presidente dos Estados Unidos (EUA) George W. Bush contesta os cientistas e declara que seu país não mais vai acatar as regras do Protocolo de Kyoto. Bush justifica o abandono dizendo que o pacto é injusto e oneroso à economia norte-americana.
- 2004 - A Agência Internacional de Energia (AIE) anuncia a China como o segundo país mais poluidor, ficando atrás apenas dos EUA.
- 2005 - O Protocolo de Kyoto entra em vigor. Em agosto, o furacão Katrina atinge os EUA e o fato é atribuído ao aquecimento global.
- 2006 - Estudos apontam a perda de gelo nos Alpes, na Europa, na Groenlândia, no Pólo Norte e na Sibéria.
- 2007 - O IPCC publica novos relatórios retificando números. Alerta que o nível dos mares poderá subir entre 18 e 59 centímetros até 2100. Ainda segundo os documentos, a elevação de dois graus centígrados na temperatura média anual do globo extinguirá cerca de 30% das espécies vegetais e animais da Terra.
Fontes: Panorama Ecologia, Greenpeace

(Pioneiro, 15/08/2007)


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