Não é por falta de mar que Minas deixa de ter papel importante no programa científico do Brasil na Antártida. O estado se tornou referência internacional nas pesquisas de solo do continente mais gelado e com maior reserva de água doce do planeta, graças ao trabalho de uma equipe da Universidade Federal de Viçosa (UFV), na Zona da Mata, a 230 quilômetros de Belo Horizonte.
Depois de sete anos do bem-sucedido projeto, com atividades de campo e laboratório, o grupo coordenado pelo professor Carlos Ernesto Schaefer, de 43 anos, garantiu à instituição conhecimento suficiente para formar o maior banco de dados sobre a chamada Antártida Marítima, que reúne ilhas e a península. Os olhos do mundo estão voltados especialmente para essa área, onde a temperatura subiu 2,5 graus em 20 anos, com o ritmo mais acelerado de degelo.
Os resultados das expedições da UFV – na última, foram 12 pessoas em dois acampamentos – são muitos, alguns pioneiros, com destaque para o mapeamento da região, considerada a mais importante para análises sobre mudanças climáticas. “Com deslocamentos diários de 20 quilômetros, a pé, já conseguimos detalhar uma área superior ao estado de Pernambuco, o que não é pouco”, compara Schaefer, que participa, de 25 a 30 deste mês, na Califórnia, EUA, de reunião sobre o monitoramento do clima e do solo do continente.
Os projetos da universidade têm patrocínio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig) e Petrobras, com apoio logístico da Marinha do Brasil.
Petróleo Durante as seis visitas à Antártida Marítima, sempre de dezembro a março, quando as temperaturas de verão ficam na casa de dois graus, os pesquisadores reuniram material para defender 11 dissertações e teses de mestrado e doutorado, publicar um livro sobre acompanhamento de solos, relevo e vegetação, composta de musgos e líquens, e fazer as primeiras fotos aéreas do lugar. Além disso, saíram na frente com as investigações sobre os microorganismos que degradam petróleo em ambiente frio, assunto que interessou à Petrobras, dona de áreas de extração no Sul da Argentina, e pronta para financiar uma tese de doutorado na UFV.
O Brasil, que tem a estação de pesquisa Comandante Ferraz, na Baía do Almirantado, Ilha Rei George, desenvolve cinco grandes projetos na Antártida, a cargo de universidades do Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), sendo a UFV a única de Minas. Nas suas expedições, a equipe de Viçosa se prende às pesquisas com os solos gelados, os criossolos ou permafrost, que representam um quinto da superfície terrestre e são estratégicos no efeito de mudanças climáticas. O projeto vai até 2009 e tem aprovação do Comitê Internacional de Pesquisas Antárticas (Scar) e Ministério da Ciência e Tecnologia/CNPq. Para o período 2007/2008, quando se comemora o Ano Polar Internacional, estão previstos mais dois acampamentos.
O acompanhamento dos criossolos pode ajudar a ciência a prever como o aquecimento global promove o degelo antártico. “Os criossolos são os primeiros a sofrer os impactos, e as formas como respondem às alterações podem ser uma das chaves que ajudarão a entender o comportamento da Terra no futuro”, explica o professor. Para o Brasil, as pesquisas na Antártida são de importância política, estratégica e ambiental. “É da Antártida que chegam as massas polares que criam as condições climáticas que vigoram no nosso país. Monitorar o clima, portanto, é antecipar problemas”, afirma.
(Por Gustavo Werneck,
Estado de Minas, 13/08/2007)