A farsa dos números da reforma agrária do MDA/Incra continuou também em 2006. Embora o governo Lula tenha anunciado em nota oficial em 30/01/2007, que havia assentado um total de 136.358 famílias e prometido divulgar a relação dos mesmos em seu site, isto não ocorreu até hoje. Mesmo assim, a farsa veio à público.
O Incra continua divulgando como assentamentos novos (Meta 1 do II PNRA) todas as famílias que tiveram as RBs - Relação de Beneficiários emitidas em 2006, pelas suas Superintendências Regionais. Isto quer dizer que, o órgão continua somando todas as famílias que tiveram suas posses regularizadas, ou que tiveram seus direitos nos assentamentos antigos reconhecidos, ou foram reassentadas em virtude da construção de barragens, como se fossem assentamentos novos.
Em primeiro lugar, em 2006, a distribuição oficial dos dados mostra que o governo teria assentado na região Sul 2.059 famílias (PR=921; SC=280 e RS=858), na região Sudeste 3.260 famílias (SP=1.018; MG=1.528; RJ=338 e ES=376), na região Centro-Oeste 14.153 famílias (MS=2.627; MT=7.971; GO=3.036 e DF=519), na Região Nordeste 35.313 famílias (BA=4.689; SE=456; AL=306; PE=8.065; PB=700; RN=1.016; CE=947; PI=6.054 e MA=13.080) e na região Norte 81.573 famílias (RO=1.007; AC= 4.595; AM=8.931; RR=1.829; AP=2.068; TO=2.015 e, pasmem todos, PA=60.638). Causa no mínimo estranheza que as três SRs do Pará tenham particularmente no último trimestre de 2006, conseguido assentar mais de 60 mil famílias, e sobretudo que a SR-30 de Santarém tivesse sozinha assentado 34 mil famílias.
Esses números oficiais mostram que 78% dos assentamentos foram realizados na Amazônia Legal e, 47,5% somente no estado do Pará. Parece que o estado da governadora petista Ana Júlia da corrente Democracia Socialista-DS, além de ser a "bola da vez" nos escândalos da grilagem de terras devolutas e públicas (ver operação Faroeste da Polícia Federal em 2004), é também, "campeão" em assentamentos oficiais do Incra. Voltarei a analisar estes dados do Pará, pois eles contêm mistérios que a própria razão desconhece.
Voltando aos dados gerais dos assentamentos oficiais de 2006, e depois de efetuado os expurgos e reclassificação dos mesmos, chega-se aos seguintes resultados:- reassentamento fundiário: 165 famílias;
- reordenação fundiária: 31.120 famílias;
- regularização fundiária: 59.294 famílias e
- reforma agrária (Meta 1 do II PNRA): 45.779 famílias.
Portanto, o MDA/Incra não fez 136 mil assentamentos novos em 2006, mas sim, apenas 45 mil. Assim, somando-se este resultado com aqueles dos três anos anteriores (2003= 24.020; 2004=34.185 e 2005=45.509), o governo Lula implantou apenas 149.490 assentamentos novos, ficando a diferença (231.929) para a regularização, reordenação e reassentamentos fundiários.
É por isso que o MDA/Incra cumpriu apenas 37,4% da Meta 1 dos assentamentos novos e, apenas 46,4% da regularização e reordenação fundiária. Deixou também, de assentar 250.510 famílias em assentamentos novos e deixou de regularizar a situação fundiária de outras 268.071 famílias. Portanto, a dívida que o MDA/Incra tem com a reforma agrária em 2007 é de mais de 390 mil famílias.
Assim, a realidade "nua e crua" que os movimentos sociais e sindicais de luta pela terra têm que acreditar é que, apenas pouco mais de um terço da reforma agrária prometida foi feita no primeiro mandato do governo Lula. Têm que acreditar também, que o MDA/Incra continua mentindo e escondendo a verdade sobre os números da reforma agrária.
E qual é a conseqüência dessa prática política?Mais de 150 mil famílias que estavam acampadas em 2003 continuam acampadas em 2007. Somando-se elas o contingente que foi para os acampamentos entre 2004 e 2006, chega-se ao total de mais de 240 mil em baixo das lonas pretas à espera da reforma agrária que não vem.
Felizmente, a verdade tarda, mas não falta, e a máscara vai caindo.
É por isso que a reforma agrária no Brasil é uma conquista dos movimentos sociais e, só ocorre quando eles vão à luta. Mas, o MDA/Incra continua acreditando que mentindo sobre o número dos assentamentos novos pode estancar a revolta que continua reinando nesses acampamentos. Ou que, enviando um mês ou outro, cestas básicas para elas, sua paciência vai continuar.
Parece que não há mais alternativa pela via institucional, para se alcançar a reforma agrária também no governo do Partido dos Trabalhadores, pois, estão deixando somente a saída da luta, agora, contra o governo do quase ex-companheiro Lula. Ele, mais do que ninguém, está agora com a palavra, porque depois de ter mantido no MDA/Incra a mesma equipe do primeiro mandato, ou pode estar sendo muito bem enganado, ou então, estar concordando com a farsa dos números. A sociedade brasileira acabará por descobrir, qual é a hipótese verdadeira.
O presidente Lula está com a palavra!
(Por Ariovaldo Umbelino de Oliveira*,
Radioagência NP /
Adital, 10/08/2007)
(*) Professor titular de Geografia Agrária pela Universidade de São Paulo (USP). Estudioso dos movimentos sociais no campo e da agricultura brasilera,. Autor, entre outros livros, de "Modo capitalista de produção (Ática, 1995)", "Agricultura camponesa no Brasil" (Contexto, 1997).