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terras quilombolas aracruz/vcp/fibria
2007-08-14
Há 19 dias os quilombolas do norte de Espírito Santo travam uma luta territorial intensa pela posse de uma terra tradicionalmente sua. A comunidade de Linharinho, uma das quase vinte que existem na região conhecida como Sapê do Norte, conta com a solidariedade de centenas de pessoas, organizações e movimentos, em sua luta por direito a terra. Direito esse que já foi cabalmente reconhecido pelo Incra, o órgão federal que regula a questão fundiária no país. Ocorre que a terra que pertence a Linharinho é, há muito tempo, ocupada pela indústria de papel e celulose Aracruz. Essa empresa multinacional instalada no Espírito Santo desde o fim da década de 1960 tomou para si larguíssimas faixas de terra pública, expulsando ou comprimindo populações que ali viviam desde muito antes. Linharinho e as demais comunidades quilombolas do Sapê do Norte começam a ter base jurídica para reaver a terra onde sempre viveram. Por isso, devolver a pressão política que sempre sofreram da Aracruz é a tática para chegar ao objetivo: a titulação da terra de Linharinho.

A ação começou no dia 23 de julho, quando centenas de pessoas ocuparam o território definido como quilombola pelo Incra mas ainda em posse da Aracruz. Além dos quilombolas da própria comunidade de Linharinho, foram para lá representantes das demais comunidades do Sapê do Norte, como as três comunidades chamadas de Angelim, a Roda d’Água, São Domingos, Dilô, Nova Vista e outras. Além deles, centenas de pessoas solidárias montaram acampamento por lá, representando o Movimento dos Sem Terra, Movimento dos Pequenos Agricultores, a Rede Alerta contra o Deserto Verde e outras organizações. Tradicionalmente comprometida com a luta territorial dos quilombolas no Espírito Santo, a FASE também prestou todo apoio à ocupação.

Até o fechamento desta edição, a ocupação resistia. Entretanto, uma liminar de reintegração de posse poderia ser cumprida a qualquer momento à base de força policial. Portanto, é iminente que mais uma vez as forças do Estado sirvam ao capital privado e seus interesses, a despeito dos direitos reais. E que direitos são esses? Segundo portaria publicado no Diário Oficial da União de 14 de maio de 2007, a terra quilombola de Linharinho tem 9.542,47 hectares. Esta é a decisão do órgão federal responsável por terras, depois de pesquisar o assunto. Mas nada menos que 82% desses hectares são tomados por eucaliptos plantados maciçamente pela Aracruz, para a produção de celulose. Os 147 hectares restantes, onde Linharinho se espreme há tantos anos, são um reflexo das injustiças socioambientais que caracterizam o meio rural brasileiro no que diz respeito à questão fundiária.

Com a posição do Incra a seu favor, a comunidade iniciou um movimento de ocupação pacífica, a fim de pressionar o Incra a declarar a titularidade da terra quilombola. Mesmo que a reintegração de posse seja cumprida pelo governo do Espírito Santo, a ocupação já é vitoriosa pela força política que adquiriu e por seu legado material: 500 mudas de árvores nativas de Mata Atlântica já plantadas em lugar da monocultura de eucalipto. Assim como na Ilha da Marambaia (RJ), onde uma comunidade quilombola vive desde o século 19 e hoje enfrenta a Marinha numa disputa sobre quem tem direito a ficar na ilha, no Espírito Santo lutar por território também é lutar pelo meio ambiente. O que é mais racional de se pensar nos dias de hoje: refazer a Mata Atlântica deixando viver nela quem tradicionalmente tem práticas sustentáveis ou entregar o território a corporações comprometidas com o próprio bolso e que degradam a biodiversidade e os recursos hídricos plantando monoculturas que falsamente chamam de florestas?

(Por Fausto Oliveira, Fase, 13/08/2007)

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