Moradores da comunidade Lagoa dos Campinhos, remanescente do quilombo Pontal dos Crioulos, no município sergipano de São Franscisco, enfrentam há cerca de dois anos um conflito com os fazendeiros que cercam a região. A situação se agravou nos últimos dois meses, segundo a representante da Comunidade, Tereza Cristina Matins.
“O conflito recomeçou no dia 23 de junho, quando o empregado do fazendeiro José Edvam Amorim colocou o cavalo para pisar em dois jovens quilombolas”, contou.
Segundo ela, os ataques continuaram depois. No dia 23 de julho, algumas pessoas da comunidade que semeavam o arroz perto da lagoa dos Campinhos foram surpreendidas novamente pelo empregado. “Ele portava uma arma e fez várias ameaças”, diz Cristina.
O outro ataque, acrescenta, ocorreu no dia 31 de julho, quando o empregado do fazendeiro colocou cachorros para atacar as ovelhas da comunidade. Uma delas morreu.
“O clima na comunidade é de muita tensão. O empregado do fazendeiro sempre diz que o maior prazer dele é 'ver um negro do quilombo amanhecer com a boca cheia de formiga'".
De acordo com Cristina, o último registro de ameaça foi em 2 de agosto, quando o caseiro do fazendeiro foi até a comunidade e, armado, fez diversas ameaçadas.
Para ela, a situação se agrava ainda mais por causa da questão territorial. “Se a comunidade passa fome e quer plantar não tem condições, pois os fazendeiros utilizam a terra que é da União para alimentar o gado”.
O território em questão foi reconhecido pela Fundação Cultural Palmares em 2004 como remanescente quilombola.
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) devia ter concluído o documento para demarcar o território em outubro de 2006. Mas, devido a algumas reivindicações da comunidade, o estudo precisou ser refeito.
“Houve alterações e foi constatado que o território precisava ser ampliado. Só agora [no mês de julho] é que o estudo foi concluído”, disse o superintendente do Incra em Sergipe, Carlos Fontinele.
Na avaliação dele, a comunidade Lagoa dos Campinhos sempre teve um histórico de conflito territorial. Por causa disso, diz, o Ministério Público do estado teve que interferir várias vezes para “amenizar o clima de tensão” na região.
“Com esses acontecimentos, o Incra vai providenciar uma visita à comunidade e aos fazendeiros para tentar amenizar os conflitos. Agora que o estudo está concluído, o prazo para audiência pública para demarcação do território é de até 90 dias”.
Comunidade cobra “ação mais efetiva” do governo, diz líder quilombola Desde que Lagoa dos Campinhos foi reconhecida pela Fundação Palmares, em 2004, os quilombolas pedem uma “ação mais efetiva do governo”, diz a representante comunitária Tereza Cristina Matins.
A comunidade, remanescente do quilombo Pontal dos Crioulos, fica no município sergipano de São Franscisco. Cerca de 150 famílias que vivem no local..
Segundo Cristina, desde que o reconhecimento foi feito, vários fazendeiros da região estão insatisfeitos com a presença dos quilombolas. “A comunidade está sendo cercada por pistoleiros, e uma ação mais efetiva por parte do poder público não foi realizada para evitar os conflitos”.
Ela diz que há registros na Polícia Federal (PF) sobre os ataques dos fazendeiros à comunidade. “Queremos que o governo federal faça uma intervenção para coibir essa ação dos fazendeiros na comunidade. Estamos nos sentindo muito ameaçados com tudo isso”.
De acordo com Cristina, a comunidade quer que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) tenha mais agilidade no processo de titulação de terras.
O instituto afirma que o estudo sobre o reconhecimento territorial da comunidade foi concluído em julho deste ano, mas só daqui a aproximadamente 90 dias ocorrerá uma audiência pública para discutir o assunto.
O superintendente do Incra em Sergipe, Carlos Fontinele, disse que a greve dos funcionários atrasou boa parte dos trabalhos do órgão.
Fazendeiro diz ser injustamente acusado por quilombolas O prefeito da cidade Telha, José João Lima, e o fazendeiro José Edvam Amorim dizem que são acusados injustamente pelos moradores da comunidade quilombola de Lagoa dos Campinhos, que fica município de São Franscisco (SE).
“Não tem nada de ameaça e tudo isso é mentira desse pessoal. Eles querem forçar uma desapropriação de terra, por isso inventam essas situações de ameaça para dizer que são sofridos”, disse Amorim, que é dono da fazenda Agro Industrial.
A representante da comunidade, Tereza Cristina Matins, contesta e afirma que as ameaças são freqüentes. “Os fazendeiros e os empregados deles fazem ameaças constantes às pessoas. Eles contam com a impunidade, pois têm recursos para pagar advogados”.
Amorim disse que entrou na Justiça contra a comunidade, com pedido de indenização de perdas e danos pela invasão territorial da fazenda. “Toda a minha conversa com esse pessoal agora é na Justiça Federal”.
O prefeito de Telha, cidade próxima à comunidade, também nega as acusações. “Estou sendo acusado injustamente de uma ação que não cometi. Não há conflito nenhum, pois eles [quilombolas] reivindicam uma propriedade que é minha”.
Segundo ele, os moradores querem ofendê-lo com “calúnias” pois ele é uma pessoa pública. “Já registrei quatro boletins de ocorrências na delegacia da cidade contra o vandalismo das pessoas dessa comunidade. Garanto por mim e pelos outros fazendeiros da região que ninguém fez ameaça alguma a essa comunidade”.
Ele diz que suas terras estão na família há quase 80 anos. “Tô tranquilo e disposto a negociar com o governo. Só não vou doar as minhas terras para essas comunidades. E não há conflito nenhum, desconheço essa palavra”.
(Por Bárbara Lobato,
Agência Brasil, 12/08/2007)