O agravo de instrumento requerendo a suspensão da liminar que prejudica os quilombolas que retomaram da Aracruz Celulose parte de seu território de Linharinho, em Conceição da Barra, não foi julgado pelo desembargador federal Raldênio Bonifácio Costa, do TRF 2ª Região, que devolveu o processo ao juiz de São Mateus. A indefinição acirra a tensão entre quilombolas e a empresa.
A posição do desembargador foi interpretada como um "tirar o corpo fora" pelo professor Júlio César Pompeu, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), coordenador do Balcão de Direitos da universidade. O Balcão de Direitos apóia a luta dos quilombolas. A causa dos descendentes dos escravos negros também é apoiada pela Rede Social de Justiça e Direitos Humanos.
O TRF 2ª Região tem jurisdição sobre o Espírito Santo. E o recurso ao tribunal tinha como objetivo suspender a liminar concedida em favor da Aracruz Celulose, empresa que ocupou e explora o território dos quilombolas há 40 anos. Mas, ao invés de acatá-lo, ou não, o desembargador simplesmente o devolveu para a Justiça Federal em São Mateus e ele será julgado pelo juiz federal substituto Leonardo Marques Lessa, o mesmo que decidiu no processo.
O desembargador não viu urgência na decisão. Mas não, diz o professor Júlio César Pompeu: está em risco a população, há risco social. E que, pela indefinição, é gradual e crescente a animosidade entre as partes e, sempre, os mais prejudicados são os mais pobres, que são os quilombolas.
A posição do desembargador foi tomada há dois dias. Segundo a estudante de Direito da Ufes Mila Vallado Fraga, assinou a petição dos quilombolas a advogada Rosane Arena Muniz.
O Agravo de Instrumento (com pedido de suspensão liminar dos efeitos da decisão impugnada) referente ao processo nº 2007.5001004271-6 é feito em nome de Vermindo dos Santos, lavrador, quilombola da comunidade de Linharinho e presidente da Associação dos Produtores de Linharinho. Ele recorre de "liminar concedida em pedido de Reintegração de Posse na Ação de Interdito Proibitório movida pela empresa Aracruz Celulose S/A em face de Altiane Blandino dos Santos" e outros.
No texto-base do Agravo, a advogada Rosane Arena Muniz conta parte da história dos quilombolas e dos processos. Em um trecho do documento, diz: "A Comunidade quilombola de Linharinho compõe o território quilombola do Sapê do Norte, que abrange parte dos municípios de Conceição da Barra e São Mateus, no Espírito Santo. Trata-se da primeira comunidade quilombola da região a ter garantido o direito constitucional de propriedade de suas terras, através da Portaria nº 78 expedida pelo Incra, que reconhece o território Quilombola de Linharinho".
Vermindo dos Santos, por sua advogada, esclarece que a decisão do juiz federal em favor da Aracruz Celulose "acabou por gerar grave lesão e de difícil reparação, na medida em que lhe impede de exercer direito pleno de propriedade reconhecido através da Portaria nº 78 publicada em 15 de maio de 2007 no Diário Oficial da União, conseqüentemente, utilizar o território da Comunidade Quilombola de Linharinho para as suas atividades produtivas, bem como, de preservação de seus usos, costumes e tradições, sendo imprescindível de igual modo a recuperação dos recursos ambientais para viabilizar existência futura da própria Comunidade".
(Por Ubervalter Coimbra,
Século Diário, 08/08/2007)