O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vai analisar denúncias de movimentos sociais de que empreendimentos financiados pelo banco estariam associados à expulsão de comunidades tradicionais, como quilombolas e indígenas, de suas terras. O compromisso foi firmado nesta quarta-feira (08/08) pelo presidente do banco, Luciano Coutinho, em encontro com os movimentos sociais integrantes da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais.
Coutinho afirmou aos ativistas que tem orientação do próprio presidente da República para que o BNDES não “compactue” com projetos que tenham irregularidades como trabalho escravo ou infantil, ou mesmo que não sigam critérios ambientais, em setores como o etanol, papel e celulose e siderurgia.
Questionado sobre projetos na área de papel e celulose acusados pelos movimentos de desrespeitar essas normas, como os da empresa Aracruz Celulose, no norte do Espírito Santo, Coutinho respondeu: “Estamos abertos a entender e não apoiar esses projetos que vieram do passado e que precisam de um novo paradigma de crescimento”.
Ele afirmou ainda que “conscientemente” o banco não apoiará jamais algum projeto que transgrida normas socioambientais ou explore trabalho infantil ou escravo. “É o diálogo com vocês que pode nos criar canais de comunicação para que a gente possa chegar perto, entender e prevenir ou não financiar atividades que estejam transgredindo”, disse ele aos ativistas.
O presidente do BNDES disse que o banco quer incentivar uma remodelagem do setor de papel e celulose no Brasil, para que as empresas estejam mais atentas aos critérios socioambientais. Ele revelou que já está conversando com os empresários e que eles têm sido receptivos em relação à possibilidade de adotar modelos que não se baseiam mais em grandes propriedades e monocultura de eucalipto.
Nessa nova forma da atividade, segundo Coutinho, haveria a associação da produção agroflorestal com pequenas propriedades da agricultura familiar, que manteriam também outras culturas de subsistência, de forma mais sustentável, em termos ambientais e sociais.
Coutinho participou da 7ª Assembléia Nacional da Rede Brasil sobre Instituições Financeiras Multilaterais, evento que segue até sexta-feira (10/08). No início do mês passado, ele já havia mantido um encontro com representantes de diversos movimentos sociais, vários deles integrantes da rede, para receber propostas dos ativistas para mudanças nos critérios utilizados pelo banco em seus empréstimos, incluindo maior transparência e rigor na análise dos impactos dos empreendimentos.
O BNDES apóia diversos empreendimentos questionados pelos movimentos sociais. Entre outros, o banco detém parte das ações da Aracruz Celulose, que é acusada de ter adquirido, nos anos 60, milhares de hectares de terras tradicionais de indígenas e descendentes de quilombolas.
Em maio, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária publicou portaria que reconhece 9,5 mil hectares na localidade de Linharinho, no município de Conceição da Barra (ES) como território de comunidade remanescente de quilombo. A terra, hoje ocupada pela Aracruz e por vários fazendeiros, incluindo pequenos proprietários, deverá ser desapropriada. Segundo a assessoria da Aracruz, a empresa questiona atualmente a decisão do Incra junto ao Ministério do Desenvolvimento Agrário.
Em Aracruz (ES), a Fundação Nacional do Índio reconhece que um grupo de índios Tupinikim e Guarani tem direito a pelo menos mais 11 mil hectares tomados pela empresa – o que a Aracruz também contesta. O assunto encontra-se, atualmente, sob análise do Ministério da Justiça, segundo a assessoria da empresa.Segundo uma das participantes do evento que questionou Coutinho sobre o tema, Gorete Almeida, da Instituto de Mulheres Negras do Amapá (Amena), há diversas denúncias de empresas financiadas pelo BNDES que expulsam descendentes de quilombolas de suas terras em todo o país. Em Macapá, ela citou o exemplo da comunidade de Lagoa dos Índios.
(Por Spensy Pimentel, Agência Brasil, 08/08/2007)