O equilíbrio ambiental já está difícil de ser mantido com os atuais 6,6 bilhões de habitantes e produção média de US$ 8 mil per capita. Por volta de 2050, a Terra poderá abrigar mais de 9 bilhões de pessoas, com produção média de US$ 20 mil ou mais. Muitos ambientalistas dão como certo que países ricos terão de cortar acentuadamente seu consumo para impedir um desastre ecológico.
Mas há outras possibilidades. Políticas públicas globais e instituições de mercado podem promover novas tecnologias que elevem o padrão de vida e ao mesmo tempo reduzam o impacto humano no ambiente. A aquacultura seria uma dessas novas tecnologias fundamentais, a criação de animais marinhos, que pode atender o crescente consumo humano de peixes e outras espécies aquáticas e reduzir a pressão sobre os ecossistemas oceânicos. O rápido desenvolvimento da aquacultura nos últimos anos tem sido chamado Revolução Azul, em referência à Revolução Verde da alta produtividade de grãos ocorrida a partir dos anos 50.
Entre os anos 50 e o presente, a pesca total, em águas abertas e abrigadas, quase quintuplicou, passando de aproximadamente 20 milhões para 95 milhões de toneladas métricas. Tanto a demanda de um mundo com rendimentos crescentes quanto a pesca feita por barcos mais eficientes contribuem para esta explosão. O mesmo efeito é causado pelos equivocados subsídios às frotas pesqueiras, refletindo o poder político do setor – comunidades pesqueiras geograficamente concentradas e indústrias. O mundo coloca a si mesmo em curso de destruição ao permitir a destruição em curso nos ecossistemas oceânicos, as conseqüências podem ser devastadoras.
Neste meio tempo surgiu a Revolução Azul, primeiro na China, e agora em várias outras partes do mundo. A produção da aquacultura cresceu de cerca de 2 milhões de toneladas métricas em 1950 para quase 50 milhões hoje. Assim, embora a pesca mundial tenha atingido seu pico no final dos anos 80, a aquacultura permitiu um aumento contínuo do consumo humano de peixes. A China é atualmente responsável por dois terços, em peso, da produção mundial em aquacultura, e por, aproximadamente, a metade dessa produção, em valores de mercado.
Na China, a criação de peixes é uma atividade milenar: várias espécies de carpas crescem entre os campos de arroz. A mistura da produção de arroz com a criação de peixes, em vez de com a pecuária como feito na Europa e nas Américas, fez sentido ecológica e economicamente. Uma vaca requer cerca de sete quilos de ração em grãos para cada quilo de carne, enquanto uma carpa precisa de cerca de três quilos ou menos. A criação de peixes economiza grãos de ração, e, é claro, a terra necessária para seu cultivo. A boa notícia, no entanto, é que recentemente os cientistas chineses aumentaram a eficiência da aquacultura e revolucionaram a gama de espécies que podem ser cultivadas. Um criterioso estudo apresentado pelo ecologista costeiro Carlos Duarte e colegas na edição de 7 de abril da Science documenta a enorme taxa de domesticação e comercialização de espécies marinhas. Das mais de 400 espécies marinhas cultivadas, 106 foram domesticadas na última década. Em contraste, sequer uma somou-se ao número das espécies terrestres domesticadas.
Mas a aquacultura sozinha não resolverá a crise pela qual os ecossistemas marinhos passam. A criação do salmão e de outras espécies que se alimentam de peixes, por exemplo, mantém a pressão sobre os oceanos, pois é necessária a pesca de enormes quantidades de peixes para alimentá-las. A aquacultura de peixes herbívoros, como carpas, tilápias e peixes-gato, é muito mais sustentável, mas mesmo nesse caso, traz desafios ecológicos significativos. Igualmente importantes são os outros desafios ecológicos da aquacultura: ela pode transmitir doenças do cativeiro para peixes selvagens, poluir as águas que a circundam com excesso de nutrientes, levar à destruição de habitats (como o desmatamento dos mangues para a criação de camarão) e ameaçar a diversidade genética pela liberação de espécies cultivadas na natureza. Como com qualquer desenvolvimento tecnológico promissor, políticas públicas terão um papel crítico através do uso prudente de iniciativas de incentivo e de coerção. Fundos públicos e prêmios deveriam ser usados para promover pesquisas de tecnologias de aquacultura.
Se normas de comercialização que limitem o total da pesca a níveis sustentáveis e contenham a exploração dos recursos marinhos comuns não forem adotadas, a pilhagem dos oceanos vai continuar. Os subsídios para o excesso de pesca oceânica também deveriam ser cortados. Práticas nefastas como o arrastão no topo de montanhas marinhas (local importante para o ciclo de vida de diversas espécies) deveriam ser proibidas por meio de acordos internacionais. Com políticas globais cuidadosas a Revolução Azul pode, efetivamente, tornar-se uma ferramenta poderosa para a nutrição humana, o bem-estar econômico e a sustentabilidade ambiental.
(Por Jeffrey Sachs,
Scientific American, 06/08/2007)
Jeffrey Sachs é diretor do Earth Institute da Universidade de Columbia (www.earth.columbia.edu).