Elas não representam nenhuma instituição ambientalista, não são de nenhuma Ong, não pertencem a nenhum grupo religioso, muito menos são filiadas a algum partido político – e isso tudo elas fazem questão de esclarecer logo. São donas de casa, muitas de cabelos brancos, que resolveram se unir pela defesa do meio ambiente em Nova Friburgo, região serrana do Rio de Janeiro. Moradoras do bairro de Muri, cercado de mata atlântica, 10 senhoras organizam um mutirão de limpeza no rio Santo Antônio nos dias 4 e 5 de agosto.
O rio, para elas, está em condição lamentável. Há muito entulho, areia, troncos e galhos de árvores que caíram nas chuvas de dezembro e janeiro, que provocaram mortes e um prejuízo de 80 milhões de reais para a região. Mas o problema não é recente: o rio Santo Antônio não passa por uma limpeza desde muito antes do dilúvio do último verão. Ali, o lixo só acumula.
A intenção do grupo de senhoras é colocar todo o lixo recolhido sobre o asfalto da estrada RJ 116, que corta o estado fluminense de Leste a Oeste. E elas prometem sentar em cima se ninguém fizer nada. “Vai ter um monte de coroa com cabelo da cor do meu sentando em cima do lixo. Ninguém está acreditando, acham que nada funciona e não sabem o que uma mulher, uma dona de casa com água no umbigo, é capaz”, afirma Maria Grillo, vizinha e parceira na organização do movimento.
Ela conta que no leito do Santo Antônio jazem poltronas velhas, móveis e até carcaça de carro. Os ratos que circulam pela área são tão grandes que parecem gatos, o que gera uma preocupação a mais: o risco da leptospirose. “É a primeira vez que estamos fazendo isso. Já fizemos muitas outras coisas, mas isso não. Reunimos um grupo de mulheres indignadas e nem lembramos mais onde - se foi na padaria, no supermercado, ou no salão. Estávamos doidas para fazer alguma coisa, e deu nisso: no mutirão e todo esse movimento”, disse Grillo.
Ela também conta que algumas agressões ao meio ambiente acontecem ao cair da noite em Muri. “Quando anoitece, carros lindos, importados, guiados por madames, param perto da margem do rio. Elas jogam lixo e não estão nem aí para o que estão fazendo”, explica. O grupo afirma que a impunidade é absoluta e por isso pede o cumprimento do código de postura ambiental, com orientação, advertência e aplicação de multas para os infratores.
Em alguns locais, o Santo Antônio esta asfixiado por uma enorme quantidade de areia e detritos. Quem o conhece bem, diz que está muito raso, com pouca água e, por excesso de desbarrancamento nas margens, o leito levantou. “Em frente da minha casa, que costuma ter uma profundidade de 4 metros, deve estar a um metro e meio apenas. Há pelo menos 6 ou 7 anos que o rio não é desassoreado”, afirma Grillo. “Estamos fazendo a nossa parte, vamos limpar o rio, mas não podemos desassoreá-lo”, completa Lílian Barreto, uma das líderes do grupo.
As mulheres encaminharam ofícios e pedidos para diversos setores em Nova Friburgo para obter apoio no fim de semana em que marcaram a limpeza de trechos do rio Santo Antônio. Solicitaram homens, materiais, ferramentas e equipamentos para a Prefeitura, para o Corpo de Bombeiros, para a EBMA (Empresa Brasileira de Meio Ambiente) e para a Rota 116 (concessionária da estrada RJ116, que passa por Muri). “Mandamos correspondência para a dona prefeita, pedimos uma série de coisas, como caminhões, a definição de um espaço apropriado para depositar o lixo das podas e coleta seletiva semanal para a coleta do lixo vegetal, além do desassoreamento do rio”, informa Lílian.
O Corpo de Bombeiros disponibilzou 10 homens e um cabo de aço. Mas pelo cálculo das organizadoras também serão necessários um caminhão guincho, uma retroescavadeira e motoserra com operador. “Vamos precisar também de cones, coletes e faixas luminosas para orientar os motoristas na estrada. Queremos placas educativas e material de conscientização”, informa Maria Grillo. Elas também querem plantar algumas árvores nas margens do rio Santo Antônio e pretendem trocar a paisagem de lixo e entulho pelos tons de amarelo, azul e lilás, de lírios e hortênsias.
Preocupadas com as próximas chuvas, elas têm pressa e querem fazer esse trabalho preventivo e educativo já. “Ainda há tempo para fazer isso até dezembro, e não podemos ter mais prejuízos materiais quiçá de vidas. Muitas famílias moram na beira do rio, e o comércio corre o risco de perder seus produtos. Por isso estamos fazendo alguma coisa”, afirma Lilian. Até o final do mês, elas vão mobilizar também as escolas de Muri, sugerindo que as crianças também façam uma limpeza pela estrada de dentro, retirando o lixo e colocando em sacos plásticos.
Depois dos dias 4 e 5 de agosto, as mulheres de Muri vão marcar uma outra data em setembro para finalizar o trabalho, se for necessário. Afinal, elas já estão tão bem organizadas que conseguiram alimentação para oferecer aos trabalhadores voluntários que se juntarem a elas. A expectativa é de que cerca de 200 pessoas participem do mutirão, que como todo bom evento de cidade do interior, deve ter até banda de música.
(Por Nai Frossard,
OEco, 31/07/2007)