A agricultura familiar é responsável por cerca de 60% dos alimentos que chegam à mesa das famílias brasileiras e pela matéria-prima para muitas indústrias, representando 85% do total de estabelecimentos rurais do país. Além disso, contribui para o esforço exportador do Brasil, sendo responsável por cerca de 10% do PIB nacional. Ao todo, são aproximadamente 4,1 milhões de famílias gerando renda e respondendo por 77% das ocupações produtivas e dos empregos no campo.
Esses dados justificam os investimentos nesse setor que, além de produzir alimentos, gera trabalho e renda, ajudando a construir um padrão sustentável de desenvolvimento.
O Plano Safra 2007/2008 da Agricultura Familiar disponibilizará R$ 12 bilhões nas diversas linhas de crédito para custeio, investimento e comercialização do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) -R$ 2 bilhões a mais do que foi investido na safra 2006/ 2007. Ao todo, serão cerca de 2,2 milhões de famílias acessando o crédito do Pronaf, com aumento de cerca de 10% dos valores médios financiados em relação à safra passada.
Além da ampliação do crédito, o Plano Safra traz outros avanços: mais recursos a juros menores, ampliação e qualificação dos serviços de assistência técnica e extensão rural, novos estímulos à diversificação produtiva, à proteção do meio ambiente e à geração de renda.
Trata-se do maior e mais completo plano da agricultura familiar. É o maior pelo volume de recursos, pela taxa de juros, que nunca foi tão baixa, e porque é capaz de agregar mais de 2 milhões de famílias ao programa. E é o mais completo porque, pela primeira vez, há um leque de políticas que cobre todo o âmbito da agricultura familiar: seguro, assistência técnica, comercialização, agroindústria e desenvolvimento territorial.
Outro elemento importante é a democratização da distribuição dos recursos, condição para a superação de distorções regionais.
Há quatro anos, 80% dos investimentos eram aplicados na região Sul; hoje, quase 50% de todos os recursos investidos estão no Nordeste, que conta com mais de 2 milhões de agricultores familiares.
Para dimensionar a importância dessas políticas, vale lembrar que, nas últimas décadas, a combinação de uma estrutura agrária concentradora e de padrões tecnológicos excludentes produziu o empobrecimento de milhares de famílias, processo que, em muitos casos, resultou na perda de suas propriedades, na perda da biodiversidade e na contaminação pelo uso intensivo de agrotóxicos.
Do ponto de vista social, o êxodo forçado do campo alimentou um processo de urbanização caótico.
Do ponto de vista ambiental, a degradação de nossas reservas naturais e a redução da biodiversidade trouxe impactos que não podemos esquecer.
A diversidade das culturas está se reduzindo nos terrenos agrícolas de todo o mundo, conforme advertência feita pela FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) em 2006.
Nos últimos cem anos, 75% das variedades agrícolas se perderam. Historicamente, o ser humano utilizou entre 7.000 e 10 mil espécies, ao passo que hoje só se cultivam 150 espécies -12 das quais representam 75% do consumo alimentar humano. Dessas, só quatro espécies são responsáveis pela metade dos nossos alimentos.
Reverter esse quadro de destruição da biodiversidade exige investimentos em práticas ambientalmente sustentáveis e em tecnologias de energia renovável.
Podemos repetir experiências do passado, concentradoras de terra e de renda, com forte impacto social e ambiental, ou trilhar novos caminhos, aliando a produção de alimentos de qualidade ao uso de biomassa para diversificar nossa matriz energética, a políticas de distribuição de renda, geração de trabalho e combate à pobreza rural.
Países como França, Itália e Alemanha mostraram como a agricultura familiar contribui para a preservação ambiental e para a melhoria da qualidade de vida da população.
Historicamente, o Brasil construiu um modelo agrícola baseado fortemente na monocultura. Os problemas sociais, ambientais e energéticos que nos desafiam parecem indicar que está na hora de seguirmos outros rumos.
(Guilherme Cassel,
Folha de S.Paulo, 30/06/2007)