Minimizar o problema do lixo na cidade de São Paulo não é só uma questão de tecnologia, mas também de planejamento urbano. Baseada nessa idéia, a arquiteta Cláudia Ruberg propõe um sistema que alia incineração (queima controlada) do lixo a uma localização racional das unidades onde será feita a redução do seu volume. “A tecnologia já existe. A questão é como ela será encarada no espaço urbano”, afirma Cláudia, que desenvolveu a proposta em sua tese de doutorado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP.
A estimativa é de que, com o novo processo, seja possível reduzir em até 98% o volume de lixo destinado aos aterros e em 32% o número de veículos circulando para transportar os rejeitos até a destinação final. “O objetivo é diminuir o impacto do transporte de lixo, minimizando as distâncias, e a necessidade de grandes áreas de aterro sanitário”, conta a pesquisadora.
Das quase 9 mil toneladas diárias de lixo produzidas em São Paulo, restaria pouco menos que 30% em subprodutos da queima, sendo que desses, 25% poderia ser tratado e utilizado na construção civil. Apenas a cinza volante, que representa 2% da massa total de lixo incinerado, deve ser destinada aos aterros, por concentrar poluentes.
Os equipamentos a serem utilizados nas unidades incineradoras devem receber entre 1.400 e 1.560 toneladas de lixo por dia. “A idéia é que a área no entorno receba uma proteção vegetal, que isolaria o equipamento e reduziria os ruídos”, propõe a pesquisadora.
Caminho do lixoCláudia explica que, hoje, é preciso atravessar a cidade para que o lixo chegue até o aterro. Por isso, sua proposta tem como elemento viário principal o Rodoanel, que não está finalizado, mas permitirá acesso à cidade sem trafegar por dentro dela.
São cinco unidades de incineração dispostas em torno desse anel – duas em São Paulo e outras três na região metropolitana – e uma sexta unidade na Zona Sul. “A idéia é distribuir as estações racionalmente pelo espaço metropolitano e localizá-las próximas a rodovias, para facilitar o acesso”, comenta a arquiteta.
A proposta dá conta de outro problema paulistano: as estações de transferência, locais para onde o lixo é levado antes de se dirigir aos aterros. As carretas que saem das três estações existentes geram impacto nas vias e no seu entorno, como ruídos e mal-cheiro. Cláudia estima que sejam feitas 1.240 viagens por dia de carretas e caminhões compactadores de lixo. Com a proposta, as estações são eliminadas e o número de viagens necessárias – no caso, entre os locais de coleta e as unidades de incineração e entre as unidades e os aterros – cairia para 998.
Falta de espaçoA incineração foi adotada pela pesquisadora por ser viável e possibilitar o recebimento de grande volume de resíduos. “Em Paris, há estações de incineração e está se investindo nisso. No Japão, se o lixo não pode ser reciclado, ele é incinerado. Lá, a questão do espaço é muito importante”.
Os aterros paulistanos em operação – Bandeirantes, na Zona Norte, e São João, na Zona Leste – estão no limite da capacidade. “Eles ocupam grandes áreas (140 e 85 hectares) e há locais com mais de 100 metros de altura de resíduos confinados. Encontrar uma nova área para destinação do lixo é um desafio – e um investimento – muito grande”, diz Cláudia. Por isso, a arquiteta defende que “é preciso pensar em novas tecnologias para redução de resíduos”.
Um dos problemas da incineração está na emissão de gases tóxicos e até mesmo cancerígenos gerados pela queima de lixo. Mas, segundo Cláudia, essa tecnologia tem sido melhorada a fim de tratar esses gases. “A legislação européia é muito restritiva nesse sentido e, ainda assim, utiliza-se e investe-se em incineração”, afirma a arquiteta. “Não há outro meio. Apenas o resíduo último, que não pode ser tratado e reaproveitado, deve ser ‘jogado fora’. Aterro sanitário não é solução em megacidades como São Paulo.”
(Por Aline Moraes, da
Agência USP, 28/07/2007)