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parque nacional do xingu
2007-07-26
Brasil precisa repensar suas prioridades, opina Washington Novaes
  
Neste trecho da entrevista à Agência Brasil, o diretor de Xingu – A Terra Ameaçada, Washington Novaes, comenta o avanço do agronegócio na região onde fica o parque indígena (norte de Mato Grosso e sul do Pará).

Na avaliação de Novaes, que foi secretário de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Distrito Federal e um dos relatores da Agenda 21 brasileira, o país não estrutura sua economia com base no que tem de mais promissor. Leia o segundo trecho da entrevista concedida à Agência Brasil. Confira, também, o primeiro e o terceiro trecho.
 
Agência Brasil: Além das questões culturais, o subtítulo de sua nova série de documentários, A Terra Ameaçada, tem a ver com o entorno do parque.
Washington Novaes: O Xingu, você vê, é uma ilha de vegetação e de rios limpos, cercado pelo desmatamento da soja, da agropecuária, por hidrelétricas, por garimpeiro, por madeireiro. Já está sendo fortemente afetado pelas mudanças. Há um aquecimento evidente, causado pelo desmatamento no entorno. Alguns dos rios já chegam com agrotóxico, com sedimentos resultantes da erosão nessas atividades, que não respeitam mata ciliar [às margens dos cursos d'água, e cuja conservação é obrigatória], não respeitam nada. Os peixes podem ser afetados pelas hidrelétricas, e peixe é um dos alimentos fundamentais ali, com a mandioca.
O Brasil tinha que ter visão estratégica. Dar-se conta nas suas políticas de que que é detentor do fator mais escasso no mundo, recursos e serviços naturais, e de que o índio é guardião deles. Estamos consumindo, no mundo, acima da capacidade de reposição da biosfera, e mudanças climáticas são o segundo problema crucial. Um país que tem uma dimensão continental, tem 12% da água superficial, tem um terço da biodiversidade, tem possibilidade de uma matriz energética limpa e continua atado a um modelo que vigora há 500 anos, de exportar baratinho produtos primários e grãos para os países centrais...
 
ABr: Nesse contexto, como o senhor vê a expansão do biodiesel e do etanol?
Novaes: As biomassas para produzir energia limpa, que podem ser uma das soluções [no combate ao aquecimento], ameaçam se tornar um grave problema. O álcool, por exemplo: é evidente que precisa haver um zoneamento para saber onde você pode plantar sem danos. É preciso também estabelecer regras, como alternação de culturas, para não ter monoculturas extensas. Juntar isso com a agricultura familiar, para ela não ser despejada dos lugares que ocupa, como já aconteceu no estado de São Paulo. Criar cooperativas para fornecerem cana, ou soja, ou pinhão-manso, ou a matéria-prima que for, para as usinas centrais, mas não transformá-los em fornecedores com preços aviltados. É preciso impedir as queimadas. Criar regras para remuneração dos trabalhadores, que hoje são quase escravos. E não deve ser essa a única alternativa. O Brasil tem altas possibilidades na energia eólica, na energia das marés, na solar. Um estudo mostra que se você ocupasse um quarto da Usina de Itaipu com placas de energia solar produziria o mesmo que a usina. E o Xingu não escapa a essa regra. O entorno precisa ser preservado, ele é uma preciosidade. São mais de 20 mil quilômetros quadrados praticamente intactos. Isso é quase uma Bélgica. Minha tese é que o Xingu deveria ser reconhecido como patrimônio histórico, ambiental e cultural da humanidade.
 
ABr: Levantamento do ano passado mostra bem isso – o baixo índice de desmatamento em boa parte da terras indígenas. Por outro lado, pesquisadores têm alertado para a insustentabilidade de algumas atividades indígenas, como a a caça para arte plumária, em muitos locais. É possível pensar numa limitação, algum tipo de manejo?
Novaes: De fato, diversos estudos mostram que o formato mais eficaz para a conservação da biodiversidade está nas áreas indígenas. Não está nem nos parques, nas áreas fechadas, nem nas áreas de proteção permanente. As áreas indígenas significam hoje 23% da Amazônia. Mas é preciso pensar nessas questões. No Xingu mesmo, com o uso de caramujos em colares para a venda, eles já estão escasseando. Os Kuikuro estão fazendo intercâmbio com os Pataxó, fornecendo penas para eles. É evidente que isso vai levar a um uso excessivo tanto de caramujos como de aves. Os mais velhos dizem que o centro de preocupação deles está na educação. Desde que se implantou nas aldeias a educação bilíngüe, as crianças e os jovens passaram a aprender a língua portuguesa. A televisão se tornou uma presença muito forte, e eles vão incorporando novos valores e formatos de viver. Esse assunto não está em discussão ainda no Ministério da Educação, nem na Funai, em lugar nenhum. Não sei se se deve interromper [o ensino de português], mas acho que se deve discutir. É possível também que se pense uma política estabelecendo uma uma compensação para não haver um uso excessivo de recursos. Isso tudo precisa ser discutido com urgência.

 
(Por Pedro Biondi, Agência Brasil, 25/07/2007)

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