Quem imagina o maior pólo de etanol do Brasil ainda pontilhado por bóias-frias esfarrapados e submetidos a condições subumanas de trabalho precisa se reciclar.
No interior de São Paulo, onde se produz mais da metade do combustível nacional, o salário mensal de um cortador de cana varia de R$ 800 a R$ 1 mil. E há pausas de 15 minutos pela manhã e à tarde no turno de sete horas e vinte minutos, sem contar o horário do almoço. Pode não ser muito, mas é o suficiente para um contingente estimado em meio milhão de pessoas no país tremer diante do avanço das máquinas.
- Nos últimos anos, as condições de trabalho melhoraram muito. Ainda estamos longe do ideal, mas não dá para comparar com o que havia há 10 anos, quando o turno chegava a 18 horas, a partir das 4h da manhã - garante Silvio Palviqueres, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Ribeirão Preto e primeiro-secretário da Federação dos Trabalhadores em Agricultura do Estado de São Paulo.
Ainda há casos, admite Palviqueres, de migrantes jogados em alojamentos improvisados nas periferias das cidades:
- Já vimos locais com 20 pessoas e um banheiro, mas hoje isso é exceção.
Com a terceirização proibida e a ajuda do Ministério Público do Trabalho, foi possível reduzir o número de trabalhadores que usavam chinelos e o emprego de menores no corte da cana. Agora, a mecanização é a maior preocupação.
- Neste ano, já diminuiu 20% da mão-de-obra - relata Palviqueres.
A redução de custo das máquinas e a disposição de evitar as queimadas que permitem uma entrada mais fácil na lavoura estão levando ao aumento da mecanização. Um lei estadual baniu as queimadas a partir de 2017.
- Se continuar assim, vai ter pouco cortador de cana. As usinas não pensam no lado social - reclama, finalmente, o sindicalista.
Para o trabalho temporário da colheita, que vai de abril a novembro, chegam levas de migrantes. No caso dos 15 municípios próximos a Ribeirão Preto, a maioria vem do Maranhão. No intervalo, só metade continua ocupada. Parte dos demais volta para as cidades de origem.
Palviqueres pondera que é possível fazer o corte com "cana crua", mas os produtores não querem porque a produtividade cai pela metade. Proporcionar cursos para que os cortadores passem a operar máquinas também não é solução, segundo o sindicalista:
- Uma máquina tira 80 trabalhadores e emprega de seis a oito.
(
ZH, 25/07/2007)