É comum em conversas sobre ambientalismo ouvir que o capitalismo é incompatível com a preservação. O que quase ninguém sabe é que o histórico de poluição socialista é bem pior, especialmente na União Soviética. A China é um caso à parte. No passado de comunismo puro, muita terra agricultável foi destruída por más práticas. Agora, sua poluição industrial é um problema mundial. A China atual tem duas cabeças. Numa está o planejamento central e a autocracia comunista que faz o que quer e expropria quem quiser. Na outra, empresas privadas que puxam um crescimento espantoso. Talvez o país tenha misturado o pior dos dois sistemas: o dinamismo produtivo do capitalismo e a falta de direito individuais e de propriedade do comunismo. Mas vamos a U.S.S.R. Em 1986, na Ucrânia, aconteceu Chernobyl, o mais trágico acidente nuclear até hoje. Ele é um bom exemplo do descaso soviético com o meio ambiente e com seus cidadãos. Mais existem muitos outros.
O artigo “Environmental disaster in eastern Europe, publicado em 2000 pelo Le monde diplomatique diz o seguinte:
Ao optar pelo desenvolvimento econômico através de uma industrialização a todo pano e agricultura intensiva, a União Soviética e os países da Europa Oriental mostraram pouco interesse pelo meio ambiente. A bacia do mar de Aral foi transformada em uma vasta plantação de algodão, enquanto atividades nucleares se concentraram no mar de Barents, apesar da fragilidade dos ecossistemas locais...
(A crise) Foi agravada por uma obstinada centralização que ignorou condições locais...
Controle de poluição do ar, tratamento de água e modernização do aparato produtivo foram todos negligenciados. Grandes extensões de terra foram severamente danificadas pela coletivização da agricultura, e o uso maciço de irrigação causou vasta erosão e salinização do solo.
Políticos e cientistas aderiram ao princípio da biosfera “auto-purificável”...
Segundo o mesmo artigo, a situação no noroeste da Rússia é catastrófica. Áreas como a península de Kola e a ilha de Novaya Zemlya foram devastadas. O ar foi poluído por metalúrgicas e fábricas de celulose, assim como a maior parte das florestas locais destruída. O Mar de Berings foi usado como lixo para resíduos nucleares de usinas e testes militares. A história do Mar de Aral é particularmente triste. Os problemas começaram na década de 20, quando os planejadores soviéticos decidiram desviar as águas de dois dos seus principais afluentes, os rios Amu Darya e Syr Darya, para irrigação de terras desérticas. Em 1987, o lago, que já havia sido o quarto do mundo, tinha diminuído ao ponto de se dividir em dois, o Aral do Norte e o do Sul. O processo continuou e, hoje, ele já perdeu 80% do seu volume e três quartos do seu espelho de água. Em menor escala, mas ainda assim dramática, o mesmo está acontecendo com o Mar Cáspio.
Em artigo de 1992, intitulado “Why socialism causes pollution”, Thomas Dilorenzo, economista americano francamente liberal cita outros exemplos do fenômeno. Na União Soviética, relata, a maioria das cidades não tinha rede nem tratamento de esgoto. O mais importante rio da Rússia e mais longo da Europa, o Volga, recebia esgoto in natura das cidades e efluentes tóxicos de centenas de indústrias às suas margens. Tudo isso desaguava no debilitado Cáspio, respondendo por metade da sua poluição. O Mar Negro, por décadas, teve areia, cascalho e árvores livremente retiradas de suas margens para alimentar a construção civil. O resultado foi que a erosão destruiu metade da sua área costeira até o ponto em que desabaram casas, hospitais e hotéis próximos às margens.
Na Polônia, segundo a Academia Polonesa de Ciências, um terço dos 38 milhões de habitantes do país viviam em áreas de desastre ecológico. E 65% das águas do país eram impróprias até para uso industrial. Na antiga capital, Cracóvia, a chuva ácida destruiu o teto recoberto de ouro numa igreja do século XVI. Em Katowice, região industrial, a acidez corroeu as linhas de trem ao ponto de limitar a velocidade de tráfego a 40 km por hora. Na antiga Checoslováquia, o excesso de uso de fertilizantes criou uma grossa camada de solo tóxico em amplas áreas rurais. Na região da Boêmia, a poluição do ar era tão ruim que causou desflorestamento maciço. A concentração de dióxido de enxofre no país era oito vezes maior que a americana. Na Alemanha Oriental, em Leipzig, metade das crianças era tratada, todo ano, de doenças advindas da poluição do ar. Por ironia, o colapso do comunismo e a recessão que o seguiu levou de roldão as indústrias e reduziu a poluição. Foi por isso que a Rússia não hesitou em assinar Kyoto.
Di Lorenzo prossegue com uma comparação interessante. O setor público americano também tem um histórico ambiental vexatório. O pior exemplo vem do Departamento de Defesa, um dos maiores poluidores do país e, mesmo assim, livre das regulações da EPA (Enviromental Protection Agency). O mesmo caso ocorreu com usinas de energia federais. No sul do país, onde a Tenessee Valley Authority operava 59 usinas, os estados se rebelaram e exigiram aderência as leis ambientais locais. Perderam o processo. A suprema corte isentou o governo federal de seguir as leis estaduais.
A situação no Brasil parece a mesma. Grandes estatais, como (foi) a CSN ou a Petrobrás nunca foram exemplos de preservação ambiental. Na esfera municipal, os lixões espalhados pelo país são uma vergonha. E a atual briga pelas hidroelétricas do rio Madeira mostra que o governo federal torce o braço até das suas próprias agências para privilegiar a indústria e o crescimento econômico. Por que a performance ambiental do socialismo e de empresas estatais costuma ser tão desastrosa? Ao invés de uma longa teorização, talvez a seguinte brincadeira ajude a entender a questão. Sabe qual é a diferença entre empresas estatais e privadas? O governo só consegue controlar as últimas.
(Por Eduardo Pegurier, O Eco, 21/07/2007)