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uso de gravata
2007-07-20

A gravata é um símbolo fálico. Da vez primeira em que ouvi essa frase, voei para meus pais e pedi uma gravata para o Natal. “Será que Papai Noel traz?” Eu era muito menino, não sabia o que eram “gravata” e “fálico”. Só podia ser coisa boa, deduzi. “Símbolo”, eu tinha a vaga noção de que constituía algo formidável, uma vez que era obrigado a cantar, no colégio, entre os vários hinos, aquele que falava de nossa bandeira como “querido símbolo da terra, da amada terra do Brasil”.

Acho que assim se solfejava. Acabei levando um pito de meu pai, uma vez que, em sua opinião, eu estava sendo indevidamente irônico. A ironia, explicou-me mais tarde com mais calma, é algo que vem a idade. “Assim… assim como…” – e ele hesitou até encontrar o paralelo óbvio – “assim como a gravata, ora bolas! Pai da gente, até uma certa idade nossa, está sempre certo. Pai só começa a errar furiosamente depois que completamos 18 anos de idade. Logo, logo eu fui iniciado nos mistérios da gravata e seu uso.

O colégio não exigia gravata, quando passei para o ginasial. Bastavam as calças compridas, para meu grande orgulho. Um dia, um horrendo e não belo dia, no início de minha puberdade (um presente inesperado e cheio de surpresas que Papai Noel deixou debaixo da árvore para mim), eu, que morava no Rio, hoje apodado de “Rio antigo” por aqueles que não suportam a idéia de que a cidade já foi mesmo muito melhor do que é, hoje em dia, eu – dizia este vosso criado – fui ao cinema no centro da cidade maravilhosa para valer na época.

Cine Palácio, ali perto da Senador Dantas e da Mesbla, bem em frente ao Passeio Público. O filme? Não tenho a menor idéia. Nem tinha importância. Todos os filmes eram bons, principalmente os coloridos e sem angústia existencial. Diante da bilheteria, pronto para comprar minha entrada: estudantes, Cr$ 3,60, adultos, Cr$ 7,20. A bilheteira, com um jeitão aporrinhado, me avisou: “Sem gravata não entra, meu filho”. Não serei mendaz. Fiquei, na devida ordem, primeiro, fulo da vida. Logo depois, decepcionado.

Afinal subi a Senador Dantas e peguei, no Tabuleiro da Baiana, o bonde 13 (Ipanema-Túnel Novo). Era no bonde, modesta condução extinta, que se realizavam os mais profundos exames de consciência, seguidos em geral de revelações destinadas a mudar o rumo de nossa vida – isso não sucedia no ônibus, lotação ou táxi. No bonde, mais precisamente no reboque, onde gostava de me sentar, banhou-me, como os respingos de uma ressaca, um certo orgulho. Eu era um homem e precisava de uma gravata.

Chegara, enfim, o grande dia. Talvez tão importante quanto aquele em que, na rua do Riachuelo, às 3 da tarde de um dia de semana, nós três, João Carlos, Mauro e eu, fomos ao apartamento azul, com abajur lilás e radinho ligado, da Olga Perna Seca conferir uma das grandes verdades da vida pela módica quantia de Cr$ 50,00. A gravata, com o correr do tempo, passada a adolescência e chegada a maturidade, só me encheu as medidas. Não tinha sentido, naquele clima, daquela cidade, ir trabalhar, todo santo dia, de terninho e gravata. A vida começou a virar chateação após chateação. Quanto à Olga Perna Seca, não sei que fim levou. Espero que tenha sido imensamente feliz. Não deve nunca ter chateado ninguém.

Acertando os ponteiros da gravata
Tudo isso me veio à tona de minha perturbada mente, ao ler a pequena nota num jornal da semana que passou: na Itália, onde o verão anda esbravejando, ao contrário de no Reino Unido, autoridades ligadas à saúde, indústria e comércio recomendaram a toda a população masculina (e feminina, em casos excepcionais) que fossem todos trabalhar ou folgar sem gravata. Sem gravata, repito.

Ao que parece, os cientistas (sempre eles) chegaram à conclusão de que sem gravata a temperatura do corpo humano cai de 2 a 3 graus. Além dos benefícios pessoais, e o bem estar geral, a medida pode fazer baixar a necessidade do ar condicionado, ou seja, do consumo de energia elétrica, o que é bom para o bolso de todo o mundo, sem falar no benefício que traz para o meio-ambiente mediterrâneo, e, por extensão, do mundo inteiro.

Resumindo
Muito interessante essa história toda. Inclusive, para incrementar, acrescento que o étimo de “gravata” está em “croata”, povo que ia às guerras com um lenço de enfeite em torno do pescoço. Vaidade, tudo é vaidade e símbolo fálico. Como só usei gravata um único dia nos últimos 29 anos, ela me fala pouquíssimo à minha temperatura pessoal e intransferível. De interessante mesmo (sou sincero), gostei foi de me lembrar da Olga Perna Seca, lá na rua do Riachuelo. Onde a temperatura é para sempre amena e dispensa o uso de gravatas.
(Por Ivan Lessa, BBC, 19/07/2007)


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