Vinte e dois anos depois, o reencontro do documentarista Washington Novaes com a “Terra Mágica”. A partir do próximo dia 29, o Brasil faz um retorno ao misterioso universo dos povos do Xingu, guiado pela narrativa poética do jornalista e documentarista Washington Novaes, pelo olhar transcendente do diretor de fotografia Lula Araújo e o ritmo sedutor do diretor de edição João Paulo Carvalho. A mesma equipe que, em 1984, produziu a série “Xingu, a Terra Mágica”, revelando ao país e ao mundo a beleza e encantamentos de cinco grupos indígenas da região - Waurá, Kuikuro, Yawalapiti, Metuktire e Panará -, voltou no ano passado a documentá-los. O resultado desse reencontro é a nova série “Xingu – a Terra Ameaçada”, que estréia na TV Cultura, sob o patrocínio da Natura e da Petrobrás, através da Lei Rouanet e da Lei do Audiovisual.
A série original foi ao ar em 1985, sendo imediatamente consagrada pelo público e pela crítica como uma das mais belas narrativas de não-ficção já exibidas pela tv brasileira. Chegou ao último capítulo alcançando 20 pontos no Ibope. Além disso, recebeu diversos prêmio no Brasil e no exterior, como no Festival de Cinema e TV de Havana e no Festival de Seul, e contou com uma sala especial na prestigiada Bienal de Veneza, em 1986.
Para a nova série, Washington Novaes reuniu grande parte da mesma equipe de 1984: além do diretor de fotografia Lula Araújo e do diretor de edição João Paulo Carvalho, o renomado artista plástico Siron Franco assina novamente a direção de arte da série. Sinal dos tempos, teve ainda dois jovens cineastas indígenas como assistentes de fotografia - Maricá Kuikuro e Kiampopri Panará. Também se juntaram ao projeto os quatro filhos de Washington: Pedro Novaes, como diretor de produção; Marcelo Novaes, como cameraman e fotógrafo de still; João divide a produção executiva com Guilherme Novaes, Cláudio Pereira e com o jornalista Roberto D´Ávila, sócios da Intervídeo, que também coproduziu a série original. Além destes, Pedro Moreira foi ao Xingu como técnico de som.
Mas o que aconteceu aos povos do Xingu em duas décadas de convivência mais próxima com o branco, aceleração das mudanças climáticas, evolução tecnológica, globalização? Washington Novaes reencontra o Xingu ilhado entre pastagens, estradas, hidrelétricas e extensas áreas desmatadas para o plantio de soja. O Parque Indígena e seus habitantes sofrem os efeitos da devastação ambiental a sua volta e da proximidade cada vez maior com a sociedade envolvente. As aldeias estão invadidas por antenas parabólicas, placas de energia solar, motores a diesel e toda uma parafernália eletrônica. Os pajés já são pouco porque os jovens não assumem mais a missão longa e sacrificada. Querem assistir tv, usar roupas de fábrica, tênis, óculos escuros, dançar forró e - suprema ambição – passear de moto pelas aldeias.
“O mundo do índio é muito diferente do nosso – lembra Washington. É regido pelos espíritos da água, do fogo, da terra, dos animais, das coisas, enfim, tudo tem relação com o sagrado”. Ele lembra que, neste território, a tecnologia e recursos científicos do branco contribuem para o risco da perda definitiva da identidade com a exposição exacerbada dos jovens a cultura do branco. “Os líderes antigos dizem que os jovens têm uma ilusão enorme do mundo dos brancos, acham que é tudo bonito e fácil, não sabem como é difícil a sobrevivência neste mundo. É um momento muito difícil, em que há uma tensão interna muito forte, mas não dá pra avaliar os desdobramentos”.
Mas, felizmente, como diz Washington, “ainda é um momento de coexistência das duas culturas, a do índio e a do branco”. Graças a isso, o telespectador de “Xingu – a Terra Ameaçada” ainda vai poder se encantar com os belos e comoventes flagrantes de manifestações culturais mantidas bem vivas pelos grupos indígenas novamente documentados. A Festa do Pequi, a Festa do Espírito do Beija Flor, a Dança do Papagaio, o Kuarup, festa maior do Alto Xingu, um ritual para agradar o espírito que roubou a alma de um rapaz, a iniciação dos jovens com a bateção de marimbondos entre os Panará e uma emocionante e espontânea reconstituição feita pelos Metuktire do momento histórico do primeiro contato com os irmãos Villas Boas. “O encontro com o índio é um mergulho em outro espaço, em outro tempo. Um espaço aberto, de céu e terra, amplo, água e fogo. Um espaço colorido e pródigo, povoado por animais, vegetais, minerais e espíritos” – avisa Washington Novaes.
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Envolverde/Focus, 18/07/2007)