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transporte ferroviário APA Capivari Monos
2007-07-18
Trecho da linha férrea que liga o Porto de Santos ao interior do Estado é ampliado sem que medidas de compensação ou mitigação tivessem sido tomadas. A obra já causa transtornos para os moradores da região e pode levar a novas ocupações irregulares na Área de Proteção Ambiental.

Enquanto o Trecho Sul do Rodoanel entra em seu segundo mês de obras, a duplicação de um trecho de uma ferrovia que também corta a região dos mananciais da zona sul de São Paulo já foi iniciada e concluída. Pior: a obra passa por dentro de uma das duas únicas Áreas de Proteção Ambiental da capital - a APA Capivari Monos - e foi feita sem a realização de licenciamento ambiental.  A duplicação de 1.5 km da ferrovia terminou no final de 2006 e apenas no final de junho o Conselho Gestor da APA Capivari Monos tomou ciência do empreendimento, que já causa impactos diretos e indiretos na região.

A ferrovia é utilizada diariamente por 16 trens e transporta principalmente produtos agrícolas.

De acordo com os moradores da vila de Engenheiro Marsilac, localizada dentro da APA e que abriga cerca de 2 mil pessoas, a duplicação da ferrovia tem aumentado o tráfego de trens e os níveis de ruído e trepidação. A linha férrea passa ao lado do centro da vila, chegando a ficar a menos de 30 metros de algumas casas. “Os trens estacionam no trecho duplicado esperando a passagem de outro trem e ficam fazendo barulho a noite inteira, é impossível dormir”, diz a moradora Cleuza Pedra da Silva, 50 anos. Ela diz que os moradores das casas localizadas ao lado do trilho não têm como acessar o centro de Marsilac quando o comboio de vagões está estacionado. “Para ir à escola, as crianças chegam a passar por baixo do trem, é muito perigoso”, diz.

A presidente da Associação Comunitária de Engenheiro Marsilac e Adjacências (Acoema), Lúcia Cirillo, também reclama do barulho noturno causado pelas máquinas e prevê problemas para a APA.  “Nossa preocupação é com o que vai ocorrer a longo prazo, pois a ocupação irregular e a grilagem de terras seguem avançando por aqui”, afirma Lúcia.  A líder comunitária explica que a ampliação da ferrovia foi acompanhada pela abertura de uma estrada de terra paralela aos trilhos, o que tem facilitado a derrubada da mata e a construção de casas até em Áreas de Preservação Permanente (APPs), como beiras de rios.

Prejudicado a comunidade
A APA do Capivari - Monos, criada pela prefeitura de São Paulo em 2001, possui 25 mil hectares de área total – o equivale a 1/6 da área do município.  Está inserida em parte das bacias hidrográficas da Guarapiranga, Billings e do rio Capivari - Monos e também na Reserva da Biosfera do Cinturão Verde.  A APA, que também abriga as cabeceiras do rio Embu-Guaçu, o maior tributário do reservatório Guarapiranga, é um dos poucos locais com vegetação preservada na capital onde se encontram espécies de flora e fauna ameaçadas de extinção, inclusive de felinos de grande porte, como jaguatiricas e onças-pardas.  É ainda responsável por importantes serviços ambientais prestados para toda a região metropolitana, como a produção de água e a regulação climática.

A ferrovia que corta a APA é parte da linha férrea que liga o Porto de Santos ao interior de São Paulo e o Mato Grosso do Sul.  A linha vem sendo reformada pela concessionária Ferroban em parceria com as usuárias da ferrovia.  A duplicação de trechos da via férrea, os chamados pátios de manobras, serve para aumentar o fluxo de trens, pois enquanto um trem vindo do litoral em direção ao interior utiliza o trilho principal, outro comboio pode esperar no trilho paralelo a sua vez de passar.

Licenciamento em andamento
A América Latina Logística (ALL), responsável pela construção do pátio de manobras dentro da APA, afirmou em ofício ao Conselho Gestor da APA que a infra-estrutura é utilizada por empresas de diversos ramos do agronegócio, como os produtores de grãos, farelo de soja, óleo vegetal, minérios, fertilizantes, cítricos, entre outros.  Estimou a freqüência diária de trens na região da APA em aproximadamente 8 trens carregados, sentido Porto de Santos, e 8 vazios, no sentido do interior do estado.

A empresa informou também que os estudos de impacto até agora apresentados aos órgãos competentes são “revisões” de estudos sobre os impactos de outros trechos da ferrovia.  “Para o trecho específico da APA, a ferrovia já contratou empresa especializada para dar continuidade aos estudos de análise de risco entre Campinas e Santos, estudos estes que estão na fase de levantamento de dados.  Posteriormente será efetuado levantamento de campo”, informou a ALL em documento de 15 de junho.

A empresa afirma que as etapas do licenciamento estão de acordo com o cronograma aprovado pelo Ibama.  “Hoje existe, sim, esse processo de licenciamento, mas para o conselho da APA os estudos são apresentados de forma fracionada, como fizeram com o Rodoanel, com o objetivo de minimizar os impactos e mitigações da obra”, afirma o advogado Marcelo Cardoso, do Programa Mananciais do ISA e integrante do Conselho Gestor da APA.

O conselho da APA afirma que a localização do pátio de manobras é inadequada em razão dos impactos gerados pela obra e acredita que são necessários novos estudos para detalhar os efeitos sobre a mata nativa e para a comunidade de Engenheiro Marsilac.  “A criação da APA também visa garantir qualidade de vida para os moradores de lá, e isso está comprometido com a realização da obra sem nenhuma compensação ou mitigação”, esclarece Maria Lucia Bellenzani, presidente do Conselho Gestor da APA.  “É duro constatar que nem na única zona rural do município de São Paulo a população pode ter um nível de qualidade de vida decente”.

Ajustamento de Conduta
O conselho da APA realizou vistoria na área no final de junho quando constatou ocupações irregulares, além das citadas, no trecho compreendido entre Engenheiro Marsilac e Evangelista de Souza.  “Tais ocupações utilizam como via de penetração a estrada de serviço existente.  Não existe nenhum estudo sobre este impacto na região, que pode provocar adensamento populacional”, diz Marcelo Cardoso.

Em parecer sobre o caso, o conselho sugere a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) para que a ALL compense a APA pelos impactos causados.  “Entendemos que o empreendedor deve, desde já, cadastrar todas as ocupações, regulares e irregulares, existentes ao longo da ferrovia no território da APA e, com base neste cadastramento, elaborar uma alternativa de controle de passagem na estrada de serviço com a finalidade de coibir novas ocupações”, afirmam os conselheiros no parecer.  Para eles, o licenciamento em curso do projeto integral de ampliação e modernização da malha viária deve incluir compensações para a APA nos termos do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (Snuc).  Leia aqui o parecer do Conselho Gestor da APA.

(Por Bruno Weis, ISA-Instituto Socioambiental / Amazonia.org, 16/07/2007)

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