SÃO PAULO – A decisão sobre a destinação final de 11.009 hectares em Aracruz, Espírito Santo, ocupados atualmente pela empresa Aracruz Celulose, voltou às mãos do Ministro da Justiça. Reivindicada desde 1996 pelas comunidades Guarani e Tupiniquim da região, a área foi reconfirmada como indígena pela Funai na última semana.
Os pareceres técnicos e antropológicos sobre a ocupação original, elaborados pela Diretoria de Assuntos Fundiários (DAF) da Funai e que comprovam o direito constitucional dos indígenas sobre a área, foram publicadas no Diário Oficial em março de 2006. Contestados pela empresa junto ao Ministério da Justiça (MJ), os laudos foram reapresentados pela Funai em setembro do mesmo ano, o que, legalmente, daria ao então ministro, Marcio Tomás Bastos, 30 dias para finalizar o processo.
Descumprindo o prazo, em março deste ano Bastos acabou optando por não acatar os encaminhamentos da Funai, devolvendo o processo ao órgão para que compusesse “os interesses das partes".
No último dia 6, em reunião com lideranças indígenas, por fim o presidente da Funai, Marcio Meira, assinou o despacho que reencaminhou ao MJ o parecer original do órgão, no qual a Diretoria de Assuntos Fundiários recomenda a demarcação das terras como indígenas, sem acordo complementar com a empresa Aracruz.
Segundo a deputada federal Iriny Lopes (PT-ES), que tem acompanhado o caso e participou da reunião de Meira com os indígenas, o parecer da Funai afirma que não serão necessários estudos jurídicos adicionais ou qualquer outro tipo de aprofundamento legal, e que caberia agora ao ministro Tarso Genro (Justiça) assinar a portaria declaratória da Terra Indígena. “Espero que o ministro não retarde esta ação. Em reunião com a Comissão dos Direitos Humanos da Câmara no final de abril, Tarso afirmou que, concluídos os pareceres da Funai, faria o que determina a Constituição”, diz a deputada.
Já no MJ não há informações sobre o processo. De acordo com a assessoria da pasta, este é um tema sobre o qual “ninguém nunca falou” no Ministério, mas o processo está “em análise no departamento jurídico”, e é considerado muito delicado porque envolve “interesses da empresa e dos índios”.
A manutenção do processo no MJ para “avaliação jurídica”, e o conseqüente prolongamento da situação de conflito em Aracruz, podem gerar protestos maiores entre indígenas e movimentos sociais da região. Segundo despacho do procurador geral da Funai, Luiz Fernando Villares, “questões de fato, como a qualidade da ocupação e sua tradicionalidade, não são discussões jurídicas, devendo a Consultoria Jurídica esquivar-se de analisá-las. Aliado a isso, há no processo administrativo extensa comprovação probatória (documental, histórica e testemunhal) que dá razão à identificação realizada pela FUNAI. Se diferente fosse, não haveria sentido em se encaminhar o procedimento à apreciação ministerial, tendo em vista o poder econômico e político dos interessados”.
“No nosso entender, o ministro [Tarso Genro] não teria nenhum impedimento para assinar a portaria declaratória. Talvez eles estejam trabalhando internamente para evitar pressões da empresa, e em breve teremos uma boa surpresa. Em todo caso, os índios já pediram uma audiência com ele para discutir a questão. Mas até agora, não houve resposta”, afirma Winnie Overbeek, da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (Fase), que tem apoiado a luta indígena na região.
(Por Verena Glass,
Agência Carta Maior, 17/07/2007)