Ao estudar a fundo as partículas que compõem a borracha natural, o resultado foi a criação e o patenteamento de um produto que combina látex e argila para formar um novo material nanoestruturado: uma borracha com características modificadas cuja elasticidade pode ser controlada livremente.
Nesta quarta-feira (11/7), na 59ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Fernando Galembeck, professor do Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), descreveu o processo que levou à descoberta do novo material, que está em fase de desenvolvimento de processo de fabricação. “A nossa expectativa é bastante ambiciosa. Temos o objetivo de, em última instância, conseguir a produção de borrachas reprocessáveis de alto desempenho, que poderão ser utilizadas para a fabricação de pneus”, disse Galembeck à Agência FAPESP.
Números do Ministério do Meio Ambiente indicam que, a cada ano, cerca de 1 bilhão de pneus são descartados em todo o mundo. De acordo com Galembeck, a origem dos problemas ecológicos gerados pelos pneus está no fato de a borracha ser vulcanizada.
“Vulcanizar significa que as cadeias poliméricas estão ligadas por ligações covalentes – elas estão presas umas às outras de maneira que não podem se separar. Mesmo esquentando, a borracha não amolece. O nanocompósito poderá resultar em um produto semelhante à borracha vulcanizada, mas sem precisar utilizar esse processo – que dificulta o reprocessamento do material”, explicou.
De acordo com Galembeck, a argila é esfoliada, isto é, seus grãos são transformados em pequenas lâminas que funcionam como um reforço estrutural, que se une fortemente à superfície do látex polimérico. “A água presente no látex é eliminada e as partículas podem então se aproximar umas das outras. Com isso, o material adquire propriedades mecânicas novas — entre elas a resistência elevada a esforço – e possibilidade de reciclagem”, disse.
Imitando a naturezaA borracha natural tem propriedades que até hoje não puderam ser imitadas em laboratórios, por isso, os pesquisadores na Unicamp têm se dedicado a entender as partículas e propriedades do material natural. “O que estamos mostrando é que a borracha por si só é um nanocomposto natural. Eu atribuo as singularidades de suas propriedades a essa característica”, contou Galembeck.
Além da borracha propriamente dita (as cadeias poliméricas), a borracha natural tem uma boa quantidade de material nanoparticulado – partículas muito pequenas que contribuem para sua coesão. Conta também com uma participação de um material protéico e lipídico associado com cálcio. “Isso tudo é feito de forma pouco uniforme, irregular, mas contribui para dar à borracha natural propriedades que o análogo sintético não tem, como resistência à tração, elasticidade e capacidade de dissipação de energia sob ação mecânica”, disse.
Ao tentar compreender o processo natural, os cientistas perceberam a possibilidade de criar elastômeros termoplásticos – borrachas que se tornam plásticas quando aquecidas. “Isso é importante, porque os elastômeros hoje usados nos pneus não são assim. Os elastômeros termoplásticos são a chave para um pneu verde. Conforme descobrimos os segredos da borracha, tentamos imitar a natureza para compor esse material completo”, destacou.
A partir dos estudos sobre as propriedades do látex, o grupo de Galembeck desenvolveu o nanocompósito feito com argila. “Isso modifica completamente as características da borracha, de modo que temos bastante controle. Podemos fazer borrachas mais moles, mais duras, que deformam pouco e agüentam esforços muito grandes – todas elas termoplásticas”, disse.
(Por Fábio de Castro,
Agência Fapesp, 12/07/2007)