Hoje fui à SBPC e frustrei-me enormemente. Em 1983 vim a Belém assistir a 35ª Reunião Anual no belo campus da UFPA à margem do rio Guamá. Vinte e cinco anos depois, e eu já com outros olhos de morador da cidade, a SBPC, em sua 59a edição regressa à Feliz Luzitânia.
Esperava ver o porto de Belém congestionado por barcos-caravanas, com professores de Macapá, Manaus e Santarém sendo recebidos por bandas de nossa cidade. Mas não, o porto de Belém só serve para enviar centenas de milhares de bois vivos, que impregnam a cidade com seu cheiro de candidatos ao abate para a guerra do Líbano e para a Venezuela.
Na exposição, na parte central do Hangar, fileiras intermináveis de stands oficiais – pagos com dinheiro público – recursos estes que seriam certamente melhor empregados para trazer educadores públicos dos municípios cujo IDEB – Índice de Desenvolvimento da Educação Básica é indescritível (abaixo de 3,5). Quantas pessoas vieram de Soure? Cametá? Curuçá? Inhangapi? Afuá? Garrafão do Norte? Goianésia? Ninguém se lembrou de trazê-los até aqui.
Esperava ver filas de prefeitos beijando a mão de cientistas e pronunciando, com orgulho, os temas das conferências em que participaram, mostrando-me, entusiasmados, suas notas sobre as palestras ouvidas. Mas não, os poucos cabelos brancos que vi nas palestras de eminências como Warwick Kerr reduziam-se aos cientistas seus amigos e a alguns poucos que sabiam do valor de cada palavra deste mestre, especialmente naquela hora de almoço tão difícil de congregar pessoas.
Esperava ministros, governadores, prefeitos puxando comitivas intermináveis de educadores de seus rincões, tais como aquelas correntes que se formam nos carnavais. Mas não os vi! Os poucos políticos que se aventuraram vieram apenas para os holofotes da abertura e uma ou outra vitrine para lançarem seus programas de governo. Para ouvir, sentarem-se à platéia, dialogar com estudantes e professores, não os vi; desacostumaram-se deste exercício.
Onde os professores dos 500 municípios da Amazônia? Onde os secretários de agricultura? De educação? De Saúde? Existe algum secretário municipal de ciência e tecnologia na Amazônia?
Onde os vereadores de Belém? Os deputados estaduais do Pará e destas muitas amazônias? Onde os deputados federais? Os senadores desta nossa ainda república? Não. Eles não vieram. Será que eles acreditam que a ciência, a tecnologia, a educação seja a solução para a Amazônia machucada pela motos-serra e a pata do boi?
Será que viriam por iniciativa própria, pagando a inscrição do próprio bolso? Ou seria o nosso dinheiro que lhes forneceria passagens e diárias para ouvir Ângelo Barbosa, Ennio Candotti, Manuela Carneiro da Cunha, Davi Ianomâmi e Daniel Munduruku entre tantos mestres?
E nossos empresários? Deputados ruralistas? Agrônomos e engenheiros florestais vieram até aqui? Onde os investidores da madeira, das plantas, da farmacopéia? Quantos daqueles que afirmam acreditar no futuro da Amazônia? Quantos vieram ouvir Charles Clement discorrer que somente 1% do PIB do Brasil vem da floresta amazônica, e assim mesmo, muito de forma não sustentável? Quantos estavam na palestra sobre as plantas do futuro de Samuel Almeida, do Goeldi, e Dr. Homma, da Embrapa?
Espero que a SBPC não demore tanto a regressar a Belém. Quem sabe bordeje por cá em 2016, quando a mangueirosa completa seus 400 anos. Vejam o que encontrei na internet: "Museu deverá receber 10 milhões de euros em Belém até 2016". Não, não é a nossa Belém, é a Belém lá dos portugueses, lá da torre de Belém, dinheiro para um museu, para a cultura ... Será que em 2016 haverá hordas de educadores e políticos reservando antecipadamente sua vaga na SBPC para prestigiar este maravilhoso congraçamento da ciência e da cultura?
(Por João Meirelles Filho,
Amazonia.org.br, 12/07/2007)
João Meirelles Filho é diretor do
Instituto Peabiru, com sede em Belém, autor do "Livro de Ouro da Amazônia".