Medição do carbono pode ser feita só por equipamentos fabricados com tecnologia alemã. A Sadia está revendo todo o seu projeto de captação de gases do efeito estufa, aprovado pelo Conselho executivo das Organizações das Nações Unidas (ONU) para Mudanças Climáticas no início de 2006 e que prevê uma primeira venda escalonada de 2,460 milhões de toneladas até o final de 2012 e com o qual a empresa esperava receber perto de R$ 80 milhões.
"Houve uma mudança brusca na metodologia da ONU para a suinocultura anunciada em setembro de 2006 e agora ela exige maior sofisticação no equipamento e maior rigor na medição do carbono capturado. O problema é que estas exigências estão atreladas à aquisição de equipamentos de empresas e de tecnologia exclusivamente alemãs, o que elevou muito os custos do projeto", informou a este jornal Meire Ferreira, diretora do Instituto Sadia de Sustentabilidade, encarregado do Programa Suinocultura Sustentável Sadia – Programa 3S.
No seu planejamento inicial, o objetivo da Sadia era o de instalar biodigestores para capturar gases que provocam o efeito estufa em todas as granjas integradas de suinocultores – são 3.500 no País – mas, com as mudanças nos critérios de cálculo de emissão da ONU, que reduzem em 50% o potencial de produção de carbono e a elevação dos custos, as metas mudaram. "Só vamos poder implantar os biodigestores do projeto em um terço das granjas ou pouco mais de mil delas", diz a diretora executiva do Instituto.
O problema reside basicamente no preço do equipamento que faz a medição do carbono capturado, cujo desenvolvimento estava sendo pesquisado por fornecedores nacionais. O preço médio de cada um dos biodigestores das 850 unidades já instaladas até aqui nas granjas de integrados da Sadia era de R$ 12 mil e, com a exigência do novo equipamento, a empresa ainda não sabe o quanto irá custar cada instalação.
A Sadia obteve R$ 60,5 milhões no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para financiar todo o programa de seqüestro do metano produzido pela sua suinocultura integrada e agora também sabe que isso será suficiente para bancar apenas um terço do projeto. "Temos de buscar novas alternativas no BNDES ou uma nova fonte de recursos para os produtores restantes", informa Meire.
O programa, que utiliza o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), previsto no Protocolo de Kyoto, está sendo implantado nas regiões de Três Passos (RS), Concórdia (SC), Toledo (PR) e Uberlândia (MG). Até o momento, 92,5% dos integrados da Sadia aderiram ao 3S.
Nos planos da empresa, além de possibilitar a comercialização do crédito de carbono, o uso do sistema de biodigestores poderia incrementar a renda do pequeno produtor, oferecendo subprodutos como estoque de biofertilizante para uso agrícola, biogás para utilização como energia elétrica ou gás de cozinha, também reduzindo nas granjas o mau cheiro característico da suinocultura. "A produção de energia para consumo próprio, por enquanto, também é inviável pelo alto custo dos equipamentos com o que o produtor não pode arcar. Mas é uma alternativa que não desprezamos para o futuro", diz a diretora do Instituto.
Neste projeto, a matéria orgânica usada nos biodigestores é proveniente dos resíduos gerados pelos suínos. Esses dejetos são fermentados por bactérias em tanques cobertos, evitando a emissão na atmosfera de gás metano (CH4), 21 vezes mais poluente que o dióxido de carbono (CO2) ou gás carbônico. O metano contido é o biogás, que pode ser utilizado em substituição ao gás de cozinha (GLP) e também na geração de energia elétrica, por meio de geradores elétricos. O produtor pode então economizar detendo fonte própria de energia.
Os 850 biodigestores foram instalados nas granjas em sistema de comodato (empréstimo gratuito de bens que não se deterioram). A empresa esperava que o retorno da venda desses créditos de carbono, cujo primeiro lote de 410 mil toneladas deve ser entregue até 31 de dezembro de 2008, seria aplicado nas próprias granjas para tornar o negócio mais sustentável.
"Nós ainda temos a vantagem de ter uma grande quantidade de carbono para negociar nos próximos anos, mas certamente nossas expectativas para o negócio foram afetadas pelas mudanças da ONU. De qualquer maneira, a redução de 50% no potencial de produção de carbono não afeta a quantidade e nem os prazos do que já comercializamos porque temos mais do que o suficiente para isso", informa Meire Ferreira.
Quem comprou as 2,46 milhões de toneladas de carbono obtidos por meio do tratamento de dejetos de suíno foi o European Carbon Fund, num negócio fechado em 25 de maio de 2006. O ECF é um fundo criado em 2005 por dois dos maiores bancos europeus, o francês Caisse des Dépôts e o belga-alemão Fortis Bank, e dirigido pela IXIS Enviroment & Infrastructures, que conta com aportes de diversas instituições financeiras.
O preço da tonelada do carbono está hoje entre € 10 e €12, mas o valor é estabelecido no ato de entrega, pelo preço do dia ele já bateu em € 20. Numa primeira estimativa, feita com os critérios antigos da ONU, a empresa acreditava ter disponíveis para oferecer ao mercado cerca de 10 milhões de toneladas e hoje o número com base nos novos critérios ainda não está calculado. "A ONU, com suas medidas mais rigorosas, atrasou em pelo menos 10 meses o nosso projeto porque não sabíamos o que fazer. De qualquer maneira, o prazo de entrega do primeiro lote e do crédito negociado estão mantidos porque a Sadia tem capacidade e bastante folga para honrar o compromisso", conclui Meire.
A venda feita pela Sadia prevê que de 2008 até 2013, serão entregues 410 mil toneladas por ano, no total de 2,460 milhões.
(Por Norberto Staviski,
Gazeta Mercantil, 16/07/2007)