O alerta é da Agência Internacional de Energia (AIE): uma crescente tendência de nacionalização dos recursos petrolíferos na Rússia pode provocar corte nas despesas com petróleo e gás em todo o mundo, embora a demanda deva aumentar mais do que o esperado em cinco anos.
Ao mesmo tempo, a Shell assinou um acordo estratégico com a companhia petroleira Rosneft, controlada pelo Kremlin, semanas depois de a britânica BP acertar um acordo similar com a também russa Gazprom, empresa estatal de gás. As duas companhias assinalaram que precisam da influência de operadoras locais para se envolver em grandes projetos no país.
A AIE criticou os governos de países produtores de energia por fazerem uso de períodos de alta nos preços do petróleo para acentuar ainda mais seu controle sobre a produção. A crítica vem em um momento em que a AIE ajustou as previsões de crescimento da demanda de petróleo, de 2% para 2,2% anuais nos próximos cinco anos, devido à explosão do consumo nos EUA e na China.
“Não é surpreendente que os consumidores focalizem na diversidade de ofertas, tanto de tipo de combustível quanto de procedência. Isto pode criar um círculo vicioso para o investimento”, afirmou a AIE, consultora de 26 nações industrializadas sediada em Paris, em seu relatório de médio prazo sobre o mercado de petróleo.
O nacionalismo de recursos, em que governos impõem regras mais duras para a independência de companhias petroleiras, forçou a Shell e a BP a abrir mão do controle dos projetos de gás Sakhalin-2 e Kovyhta, na Rússia, enquanto a ConocoPhilips não aceitou um acordo para permanecer na Venezuela.. Mas a AIE também apontou que há exemplos recentes benignos dessa tendência, com o aumento dos impostos nos países do Mar do Norte.
Todos os governos tendem a usar a alta dos preços do petróleo como oportunidade para reverter o fluxo de rendimentos a seu favor, explicou a AIE. O México, por exemplo, nacionalizou sua indústria petroleira nos anos 30 e a Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep), cartel de produtores de petróleo, formou-se na década de 60.
Nações que têm – e usam – a força de seus estoques
Rússia
O Kremlin está usando os recursos energéticos como instrumento político. Ex-integrantes da União Soviética, como a Ucrânia, já sofreram cortes no fornecimento de gás por se oporem a Moscou. As maiores empresas do setor são estatais, como a Gazprom (foto). Operações em grandes áreas produtoras, como Sacalina (no Pacífico) e Sibéria, precisam ser feitas em parceria com empresas russas.
Nigéria
As áreas de produção de petróleo, no leste e no Sul do País, são constantes focos de tensão. Milícias tribais chegam a ocupar instalações e sequestrar estrangeiros ligados ao setor
Venezuela
Hugo Chávez determinou a nacionalização das reservas de petróleo na foz do rio Orinoco. Operações só podem ser feitas em parceria com a estatal PDVSA. A petrolífera norte-americana ConocoPhilips não aceitou o acordo e saiu da região.
Bolívia
Nacionalizou as reservas de petróleo e gás e a infra-estrutura de refino, processamento e distribuição de petróleo. A Petrobras foi obrigada a vender duas refinarias, que foram assumidas pela estatal venezuelana PDVSA
Grandes fazem parcerias na Rússia
Na Rússia, as grandes empresas petrolíferas mundiais estão sendo obrigadas a fazer parcerias com os conglomerados locais. A Shell anunciou o fechamento de um acordo com a Rosneft que determina a implantação de projetos conjuntos entre as duas companhias na Rússia.
A Shell está ansiosa para acessar as grandes reservas que a Rússia oferece, enquanto a Rosneft precisa do tipo de tecnologia que o grupo anglo-holandês pode oferecer. A Shell negou que o acordo foi uma reprimenda à Gazprom, que arrebatou o controle acionário do projeto de US$ 20 bilhões Sakhalin 2, na costa do Pacífico, após alegações de que a operadora não estava cumprindo a licença.
“A Rússia tem um rol de oportunidades diversificado e significante nos quais a Shell pode colaborar.”, afirmou a Shell. Artyom Konchin, analista de petróleo da Aton Capital em Moscou, ressaltou que só o tempo dirá quão significante foi o acordo, mas acredita que ele mostrou que a Shell – assim como a BP – reconheceu que só seria possível fechar projetos multibilionários na Rússia caso desse as mãos às empresas estatais locais.
A AIE alertou em seu relatório que um aumento na capacidade adicional de refino nos próximos cinco anos retardaria esses planos devido à alta nos custos e à escassez de engenheiros. A Opep tem defendido uma política de cortar a produção para manter os preços em níveis altos e ressaltou que um movimento no Ocidente para desenvolver biocombustíveis poderia encorajá-la a cortar mais os investimentos em prospecção de petróleo.
(The Guardian / A Notícia, 15/07/2007)