Do enigma da Ilha de Páscoa até a fome devastadora que assolou a Índia no século 19, o passado pode ajudar na luta científica contra a mudança climática, que ameaça cada região agrícola do mundo. Os países pobres tropicais serão os primeiros afetados pelo aumento global das temperaturas previsto para este século, com inundações e secas que levarão à desnutrição de seus habitantes, de acordo com último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática da ONU (IPCC).
Diante desta ameaça, os cientistas se voltam para o passado, explorando como as diferentes civilizações enfrentaram perigos similares e se conseguiram ir adiante ou se foram varridas do mapa como conseqüência de um "ecossuicídio" (suicídio ecológico), segundo a terminologia do acadêmico americano Jared Diamond. O especialista cita como exemplo a Ilha de Páscoa, um pedaço de terra isolado no Oceano Pacífico, que chegou a abrigar uma população de 20.000 pessoas no passado.
Seus habitantes se extinguiram no século 18, depois que foram cortadas todas as árvores, fonte de combustível e madeira para a construção. No México, uma seca prolongada acabou com a moderna civilização maia há mil anos, enquanto o último registro viking na Groenlândia desapareceu no século 15, por causa da "Pequena Era do Gelo".
"Nos piores casos de catástrofes, as pessoas emigravam ou morriam", disse Diamond, professor de Geografia da Universidade da Califórnia, em seu aplaudido livro "Collapse: How Societies Choose To Fail or Succeed" (Colapso: Como as Sociedades Escolhem Fracassar ou Vencer, em tradução livre).
Estabelecer quais foram os erros das populações também é uma prioridade para os cientistas hoje. Um exemplo disso, afirma Evan Fraser, da Universidade britânica de Leeds, é o fato de haver um detonador comum entre as fomes arrasadoras registradas em séculos e lugares distintos.
Fraser analisou a Grande Fome da Batata na Irlanda (1845-1850), quando um milhão de pessoas morreram, e as fomes que mataram 45 milhões de pessoas na colônia britânica da Índia (1875-1902) e um milhão na Etiópia (1984-1985). Embora uma praga tenha sido responsável pelo mal irlandês, a ausência de chuvas, pelo indiano, e a seca, pelo etíope, os três tiveram algo em comum: seus sistemas agrícolas e de proteção do entorno eram frágeis.
Na Irlanda, os cultivadores de batatas tinham terras abertas, o que facilitou a chegada da praga. Na Índia, os bosques, que poderiam ter preservado a umidade, foram derrubados pelos britânicos para suas plantações de chá. No caso da Etiópia, a coletivização da agricultura no final da década de 70, segundo o modelo soviético, acabou com as pequenas comunidades de agricultores, os únicos que tinham os conhecimentos necessários para responder a uma crise.
Para Fraser, a compreensão deste tipo de desastre pode ser um instrumento útil para planejar sistemas agrícolas capazes de fazer frente à mudança climática e evitar que os desastres naturais "engulam" populações.
(Por Richard Ingham, France Presse, 13/07/2007)